E se as mulheres se vestem mais ou menos peladas por uma intuição artística?
O crítico de arte Rodrigo Naves faz parte da confraria dos que, como eu, tentam desesperadamente entender esse poder inexplicável que transita pelas ruas e atiça a inquietação masculina, a ponto de merecer o interesse do outrora respeitado Instituto de Estudos e Pesquisas Aplicadas (Ipea).
– Há mais arte na maneira de as meninas se arrumarem – ou seja, na rua, na vida – do que em dois terços da arte feita em nossos dias. Sobretudo para os leões velhos, já sem dentes para essa carne, e que apenas as observam enquanto jogo e encantamento.
Desencantado com a arte contemporânea, em que preços exponenciais e o sucesso comercial possam estar determinando o que é boa arte, ele vem tentando entender o fascínio exercido pela moda das ruas com o mesmo instrumental com que perscruta obras de arte.
Na entrevista à Ilustrada, da FSP, em que fala de seu livro de ensaios A Calma dos Dias, fala da tentativa de entender como essa moda se generalizou, “de usar um top de um jeito, a cintura mais baixa”.
– Quis fazer uma descrição disso tudo esperando ao mesmo tempo que um sentido surgisse dessa própria descrição. (…) Essa ideia de que arte é vida, tão forte hoje, também faz com que muitas vezes você deixe de olhar a vida para ver obras que falam dela, quando há pessoas na rua fazendo coisas desconcertantes.
Como eu e o resto da humanidade, embora com maior capacidade de teorização, claro, ele tenta entender “o que torna Gisele Bundchen algo deslumbrante”. No livro, tentando explicar o inexplicável, diz que:
– Tudo nela é um jogo de articulações instáveis, de compensações, em que nada adquire uma singularidade estridente, a reivindicar primazia e atenção descabida: seios fartos, pernas longas, cabelos ondulados, corpo longilíneo, olhar impenetrável, testa franca. O diabo!
Nunca tive muitas dúvidas de que as mulheres não se vestem com uma bota, uma saia curta e uma blusa decotada por questões de conforto. Visam algum efeito para além da proteção do corpo que, como homem, não ouso determinar.
Dizer que se vestem, sim, para seduzir e dominar, embora resguardem o direito de estabelecer os limites de quem e quando, é arriscado e simplório. Homens também não se vestem só para se protegerem do frio ou calor, com a desvantagem de terem se se valer da mais cruel vestimenta produzida pela humanidade, o terno e gravata terrificante dos dias de sol, ou as ridículas camisetas justas sobre os bíceps malhados.
Gostaria de ter lido de mulheres algo mais convincente. Por que e para que a mulher se enfeita? Mas, em toda a polêmica que se seguiu à fajuta pesquisa Ipea, não surgiu uma voz feminina para explicar com profundidade o fenômeno.
Talvez porque não julgassem relevante dar maior importância a tal fajutice ou talvez porque, como é da natureza delas, preferissem manter o mistério que é parte desse poder. E deixar que os homens transitem desesperados, tentando entendê-las, como leões sem dente, esperando a hora que elas determinem que se pode avançar.
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