Donald Trump fez sua carreira de empresário bem sucedido no ramo imobiliário. Construiu, restaurou ou comprou para operar hotéis, resorts e cassinos.
É um tipo de negócio estanque, fechado em si mesmo, uma ilha em cada país, da economia 1.0 que não depende de integração de sistemas e pessoas de diferentes continentes para sua operação.
Não é como a HP, por exemplo, que há dez anos tinha 150 mil funcionários em 170 países participando de forma integrada de desenvolvimento, construção, manutenção e aperfeiçoamento de sistemas de informação.
Nem como a Boeing, que fabrica 35% de sua fuselagem no Japão, turbinas e outras peças na Europa e na China, utilizando engenheiros russos, indianos ou chineses conversando o teleconferência para aperfeiçoar a produção e reduzir prazos de fabricação.
Ou o Walmart, líder de uma cadeia de suprimento mundial tocada a códigos de barra, de forma que, quando você passa um produto pelo caixa de Belo Horizonte, o fornecedor em alguma parte do planeta sabe que terá que fabricar mais uma peça para recompor o estoque.
Em um só dia das vésperas de Natal, a HP sabe que terá que fabricar 400 mil peças em suas diferentes fábricas para enviar — de boeing ou quem sabe por uma operadora de logística também mundial, como a Fedex.
Como também nunca deve ter lido um livro na vida, Trump não deve conhecer O Mundo é Plano, o extraordinário ensaio do jornalista americano Thomas Friedman, que há dez anos captou como nenhum outro as forças niveladoras que estão achatando o mundo e dando condições iguais de competição e colaboração em qualquer parte.
Nesse novo mundo, qualquer pessoa tem condições de competir e conquistar mercado com os EUA, mas os EUA têm mais condições de vender seus produtos e e plantar suas empresas em qualquer país.
>>> Veja meu artigo sobre a revolução do telemarketing que rompeu barreiras americanas para a Índia e vice-versa: O caso da Índia e por que vamos perdendo todos os bondes da história
Saberia, por exemplo, que em 2003 a indiana Tata ganhou a concorrência para aperfeiçoar o sistema de seguro desemprego do estado de Indiana, oferecendo um preço de 8 bilhões de dólares abaixo das concorrentes americanas Deloitte e Accenture.
Foi um caso exemplar de como a contratação além mar geraria economia para o cidadão americano e produziria postos de trabalho, desenvolvimento de novas tecnologias e riqueza para os dois lados. Se reduz o espaço de engenheiros locais, cria outros postos e outras oportunidades em novos segmentos.
Mas uma reação ao estilo Trump colocou no mesmo barco republicanos e democratas e fez o Estado recuar em um contrato que acabou oneroso e ineficiente, com prejuízo para o contribuinte e quem depende de seguro desemprego.
Ao mesmo tempo, deixou entrever uma uma visão retrógada que, naqueles dias, já não cabia em mundo em que as empresas não eram mais locais.
Como diz Friedman,
Antigamente se dizia que, conforme estivesse a General Motors, assim também estariam os EUA. Hoje, contudo, o que se pode dizer é que, conforme estiver a Dell, assim também estarão a Malásia, Taiwan, China, Irlanda, Índia.. A HP, atualmente conta com mais de 150 mil funcionários, espalhados por 170 países, é não só a maior fabricante de tenologia de consumo do mundo, como também a maior empresa de TI da Europa (e também da Rússia, do Oriente Médio, da África do Sul). Como pode a HP ser mesmo uma empresa americana, se a maioria de seus funcionários e clientes está fora dos EUA?
Escrito em 2004 e corrigido em duas edições posteriores nas versões digitais na Amazon, o livro é premonitório sobre o nivelamento do mundo em que não há mais espaço para áreas estanques como a recepção de um hotel de luxo e o desmanche de conceitos e segmentações políticas simplistas:
Sejamos realistas: os conservadores culturais republicanos têm muito mais em comum com os metalúrgicos de Youngstown, Ohio, os fazendeiros da China rural e os mulás do interior da Arábia Saudita, que também querem mais barreiras, do que com os banqueiros de investimento de Wall Street ou os prestadores de serviço ligados à economia global em Palo Alto, que enriquecem com o achatamento do mundo.
Não sendo hipocrisia para ganhar voto, o caso desse neófito que constrói um muro medieval 28 anos depois da derrubada do muro de Berlim deve ser de tacanhisse mesmo. Uma visão empresarial do mundo pré-globalização, 1.0, ignorante da economia integrada 3.0 que fervilha longe das paredes de seus hotéis.
Que estão à mão, num livro excelente como O Mundo é Plano, que ele poderia bem dar uma sentada para ler, antes de sair espalhando bazófia.
Guilherme Melo diz
Ramiro,
Permita-me questionar seus argumentos.
A premissa basica do seu artigo, reputar as decisões de Trump a sua origem no mercado imobiliário, e insustentável. Nao existe nenhum mercado estaque em tempo globalizados e existem inúmeras empresas imobiliárias globais e algumas com atuação inclusive no Brasil. Apenas para exemplificar, suas gigantes empresas imobiliárias americanas e que atuam no Brasil: Tishman Speyer e Hines. A integração de pessoas entre os continentes, como você mesmo citou em alguns exemplos, ocorre sem a necessidade de mobilidade física. Outro exemplo, pessoas baseadas nos EUA desenvolvem projetos nestas empresas a serem erguidos pelo mundo, somente a Hines se faz presente em mais de 180 cidades do mundo.
Outro ponto que demonstra o desconhecimento acerca da industria da construção civil e utilizar o exemplo da Boeing para afirmar a estanqueidade do setor imobiliário. Hoje temos apartamentos do Minha Casa Minha Vida que utilizam em sua execução painéis estruturais produzidos na America Latina, placas fotovoltaicas da Alemanha e outras tecnologias. Temos arquitetos estrangeiros desenvolvendo projetos mundo afora ( vide a obra de Zaha Hadid, vc conhece ? ) e especialistas em engenharia brasileiros atuando em projetos pelo mundo.
As incorporadoras realizam vendas virtuais e atendem clientes pelo mundo. Brasileiros expatriados representam um bom percentual de vendas de incorporadoras e utilizam da internet para adquirir seu imóvel.
A execução de hotéis e empreendimentos corporativos, por ser complexa, e multidisciplinar e considera vários aspectos multiculturais, étnicos e religiosos.
As atitudes e pensamentos do novo presidente americano nao tem origem em seu ramo de atuação, que ao contrario do que diz o artigo, representa um modelo de economia global e 3.0 ! Acho que e preciso uma analise menos simplista para justificar as tendências de Donald Trump acompanhadas de maior fundamentação na historia recente americana e as consequências das políticas difundidas pelos seus antecessores.
Saudacoes,
Ramiro Batista diz
Meus caros, Tereza, Cristiano, Valdir.
Posso ter carregado um pouco a mão, mas defendo o que acho que faz sentido. Com esse negócio primário de querer que as empresas americanas removam suas fábricas do exterior para dentro do país, Donald Trump passa a impressão de um primarismo alheio a tudo o que aconteceu no mundo nas últimas três décadas. Se tivesse lido O Mundo é Plano, como eu recomendei, veria que as empresas precisam ser globais para sobreviver hoje e, sendo, geram mais empregos e mais negócios para os EUA. Claro que perdem-se empregos em alguns setores, como o automobilístico, mas milhares de outros são criados em outros. Não é preciso ser brasileiro para ensiná-lo, Valdir. Há americanos brilhantes para isso, como o autor do livro, Thomas Friedman.
valdir diz
Pois é! Trump não sabe nada e o povo americano é o mais burro e estúpido da Terra; portanto, vamos tomar os EUA e expulsá-los de lá. Nós, ao contrário, sabemos tudo e temos o povo mais inteligente e culto do mundo. Afinal de contas temos cientistas de ponta em todas as áreas e sabemos e temos condições de guerreá-los. Eu quero a Califórnia.
Cristiano Marques diz
Onde Trump entra na história não deu pra entender.
Tereza Leonel diz
É demais, não?? Chamar de ignorante, neófito, imbecil que nunca leu um livro, o homem que concorreu e ganhou a Presidência do país mais importante do mundo, contra tudo e contra todos (aí incluída essa imprensa vermelha de tanto mimimi), não é??
E simplesmente confessar toda a sua própria falta de visão e autodiagnosticar-se com o que enxerga nos outros: visão 1.0. Isso, se chegar a 1.
Há pessoas que enxergam mais. Acham-se capazes de presidir o próprio país. Lutam para isso e conseguem. E há pessoas que enxergam menos: tanto não reconhecem a grandeza dos primeiros, porque ela extrapola seu campo de visão, quanto ainda se postam em afirmar que são aqueles é que enxergam menos.
É muita dor de cotovelo. Lamentável.