Modelo de entretenimento e serviço que é sucesso comercial e de audiência é oposto dos valores de racionalidade e jornalismo do empresário dono da CNN.
É grande a expectativa entre quem vive de comunicação do que vai ser a rádio Itatiaia nas mãos do seu novo dono, Rubens Menin, que tem demonstrado valores empresariais e de jornalismo completamente opostos aos praticados pela emissora de 70 anos.
É um caso raro de sucesso comercial por práticas que podem funcionar muito bem em banco e construção civil, os dois ramos que o empresário revolucionou recentemente. Mas são um risco num veículo de comunicação que pretenda oferecer isenção, se o padrão for o da CNN com que o mesmo empresário sacudiu outro ramo, o da comunicação.
A Itatiaia deve ser das poucas rentáveis do mundo, com faturamento estimado de R$ 10 milhões mensais, num mercado em extinção e estruturas enxutas em que bastam um locutor e um computador para colocar uma emissora no ar, com quase as mesmas condições de competir em audiência.
Utiliza um modelo de negócios de 70 anos, de viés familiar e critérios emocionais que mantém os mesmos apresentadores e jornalistas independente do resultado que ofereçam, em torno de uma estrutura pesada que se mantém inerte por décadas. Tem uma audiência inercial e cativa como a da Globo, faça chuva ou faça sol, que elege vereadores, deputados e senadores.
Seus apresentadores são também agenciadores de publicidade, que recheiam o salário simbólico com os patrocínios que arrancam no mercado. Alguns de seus jornalistas, como já foi muito comum em veículos do estado, ainda complementam a renda com empregos públicos.
É quase uma rádio de anúncios ou serviços patrocinados, em que muito do que vai ao ar, travestido de informação, é conteúdo publicitário. Na época em que o padrão tolerável era de dez a 15 comerciais por hora na maioria das rádios, alguém de dentro da emissora me revelou ter contado até 45 no mesmo tempo.
De tal forma que virou uma emissora quase 100% falada, menos por informação jornalística e mais por material publicitário, gravado ou testemunhado ao vivo por seus locutores. Aquele negócio do sujeito que diz no ar, bem anos 50, que usa o colchão tal, o arroz X, o plano de saúde ou funerário Y.
Em geral, depois de uma série de anúncios gravados, o apresentador emenda um ou mais testemunhais para abrir outra. Se vai informar a hora ou o tempo, informa o patrocinador. Deve ser a única que inventou comercial dentro dos informes jornalísticos de 5 minutos a cada hora, um gravado e outro falado pelo locutor.
É tão acachapante e monopolizadora do mercado publicitário de rádio, que me lembra uma espécie de Google analógico, em que há espaço tanto para o anúncio do grande banco ou da multinacional de automóveis quanto para o dono da ótica ou da oficina da esquina, amigo do locutor.
Não se pode dizer que seja uma emissora essencialmente de jornalismo, como faz crer e foi vendida para Menin. É uma emissora de serviços e entretenimento, recheada de rezas, piadas, fofocas, colunas regulares com médicos e advogados, muito pouca música e muito lero-lero.
O jornalismo é uma cunha de minutos a cada hora, um tanto burocrático nos dois jornais de maior fôlego, de manhã e ao meio dia, de cobertura crítica apenas a questões factuais. Como é tradição da imprensa mineira, nunca fez oposição. Sua fama tem mais a ver com sua estupenda capacidade financeira, técnica e de pessoal para estar em todo lugar, sobretudo atrás dos times do coração de seus ouvintes.
Seu jornalismo esportivo é a prata da casa. Em torno dele, gira toda a engrenagem do modelo de negócios para o qual Menin apontou a sua mão de Midas que, em menos de dez anos, revolucionou três dos mais poderosos ramos de negócios do país, o da construção civil, o bancário e o de comunicações.
Racionalidade e tecnologia
É um gigante desses que brilham como cometas, cavalgando uma revolução que seus concorrentes — Gutierrez e Odebrechts, Olavo Setúbal ou Amador Aguiar, Roberto Marinho ou Silvio Santos — levaram décadas.
Foi o homem que inventou a casinha e o apartamentinho de 47 metros quadrados do Minha Casa Minha Vida, fez os grandes bancos comer poeira com um totalmente digital e enfiou goela abaixo dos barões da imprensa o mais respeitado canal de notícias do mundo.
Dono da MRV, do Ínter e da CNN, ainda se mexe para mudar o mercado de logística, na LOGG3, e expande seus braços para uma vinícola de 55 hectares em Portugal. Da mesma forma que entrou para sacudir o Clube Atlético Mineiro, que o levou por osmose à rádio Itatiaia, quase intérprete dos três maiores clubes mineiros.
Com um foco de racionalidade e baixo custo, imperativo dos novos negócios que explodem do dia para a noite: estruturas enxutas, impessoalidade e profissionalismo. Seja no tamanho de casas, no atendimento bancário sem gerente, no jornalismo de rede social.
Possivelmente também, imagino, em galpões que se abrem sozinhos e rolhas de silicone, mais práticas e econômicas do que as de madeira de velhas árvores que fizeram/fazem a diferença dos vinhos europeus. Ou, ainda, a partir de agora, em emissoras de rádio de pouca gente e muita tecnologia.
Não parece ser do tipo que joga dinheiro fora. Sabe muito bem para onde vai o bonde dos negócios, diferenciar o viável do ilusório, focar no principal e descartar o acessório, apostar no que dá resultado e eliminar redundância . Minimalista como convém nesses tempos de fortunas rápidas, fazer o máximo com o mínimo.
O que, parece, nada ter a ver com o modelo e a estrutura pesada que colocaram a Itatiaia onde está.
A julgar por seu padrão e se é verdade que ele quer apostar em jornalismo, o sinal é de que a emissora vai se enxugar para se enquadrar aos novos tempos e deixar de ser o grande armazém de secos e molhados que tem sido.
Empresário criativo, porém, pode ser que descubra uma forma de manter seu modelo, lucrativo, de apresentadores agenciadores, e consiga isolar o jornalismo sob um compartimento refratário a influências econômicas, como o é o da CNN.
Se, entretanto, quiser fazer dela uma rádio essencialmente jornalística, como pareceu anunciar no dia seguinte ao da compra, nos moldes da CBN, que por sinal mal se paga, vai ter que jogar tudo abaixo. Demitir todo mundo e começar de novo.
Difícil acreditar que faça qualquer das duas coisas. Vai ser excitante descobrir.
Hugo diz
Nunca li tanta merda
Werlley diz
Muito bom seus comentários