A queda do ministro da Cultura é daqueles fenômenos não raros em governos jovens em que a imaturidade tromba com a prepotência e a inabilidade de ambos provoca um estrago na imagem e no andamento da administração.
Marcelo Calero é um diplomata, alguém escolhido e preparado para ser fino, ter etiqueta, servir de algodão entre cristais nos conflitos entre países. Opera na arena do silêncio, com elevados códigos de sigilo e precaução para contornar os problemas antes que se tornem públicos.
Que tenha perdido a tramontana com a pressão do ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira para aprovar um empreendimento imobiliário contra as regras do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (Iphan), a ponto de preferir a renúncia e o estardalhaço, é sintoma de que o colega passava mesmo dos limites até aquele ponto de ebulição que tira do prumo até um diplomata frio.
Ou então é um caso de inabilidade dupla:
- dele, de usar as ferramentas que aprendeu para contornar um problema antes que se transformasse, como se transformou, num estrago para a imagem e o andamento do governo;
- de Geddel, cuja esperteza em excesso o impediu de perceber a hora de parar com um interlocutor desconfortável.
No espírito preto e branco da lei ou no mundo ideal das boas intenções, Calero pareceu estar certo. Só que no universo acinzentado da política, onde se pratica concessão por 24 horas do dia, pode ser que estivesse — numa palavra diplomática — inadequado.
Diplomacia informal
Um administrador habilidoso, mais experimentado, talhado na diplomacia informal da negociação política, teria percebido o aquecimento da fervura e procurado o ministro pessoalmente. Com o processo e um técnico do Iphan debaixo do braço, para servir de testemunha, tentaria algumas possibilidades:
- Uma concessão ao tamanho do prédio dos amigos da Bahia que o ministro da Casa Civil queria ver construído contra as normas do patrimônio público. Não precisava ser 30 andares, mas também não 13. Tira um andar de garagem aqui, aumenta uma cobertura ali, compensa na lateral o que não pode ser feito em cima, concede-se licença para outra área. Por aí. Dentro do cipoal de leis brasileiras e dos complexos escaninhos da administração pública nacional, sabe-se que é possível interpretação para tudo. Aposto minha trena de engenheiro de fim de semana que um andar a mais ou a menos não faria diferença para os técnico do instituto.
- Jogaria o problema no colo do ministro. Passaria todas as informações técnicas e legais que lhe impediriam de atendê-lo e lhe transferiria o ônus da decisão. Com a humildade disfarçada dos políticos, diria que estaria disposto a atendê-lo desde que ele levasse o problema do presidente da República e trouxesse de lá uma determinação expressa. Por escrito.
- Numa manobra mais sofisticada, diria que não veria problema em colocar seu cargo à disposição para que o governo escolhesse outro titular para seu lugar e o atendesse da forma que lhe fosse mais conveniente. Faria um discurso singelo de que iria para a casa em silêncio respeitoso e agradecido pela oportunidade que lhe fora dada de prestar serviços a um governo que considera bem intencionado… etc.
Geddel, tarimbado na diplomacia da vida que não se aprende no Instituto Rio Branco, ficaria encurralado. Passaria por intransigente se recusasse a primeira alternativa, ficaria exposto se decidisse pela ilegalidade e não poderia levar ao presidente o pedido de um ministro que se recusava a atender uma demanda pessoal. Muito menos demiti-lo por isso.
O presidente, claro, não iria colocar a mão nessa cumbuca. Ficaram ambos, presidente e chefe da Casa Civil irritados com o subordinado petulante, mas, pelo menos a curto prazo, nada poderiam fazer contra ele.
Esperteza política
O que tem de bom nesse terreno pantanoso da política é que, como cansou de dizer a maior de nossas raposas, Tancredo Neves, “a esperteza quando é demais come o dono”. Quando associada à prepotência do poder que perde seus limites, devora, digo eu.
Há um ponto em que o hábil por demasia cai num tal nível de relativização do caráter alheio que toma todo mundo como venal. Perde a perspectiva e a capacidade de julgamento.
Alguns telefonemas depois para o colega da Cultura, uma raposa como ele, não por acaso encarregado de toda articulação política do governo, saberia que não poderia atravessar o sinal com o jovem e um tanto inábil diplomata. Muito menos cometer com quem lhe era estranho confidências como a de que havia comprado um apartamento no prédio em questão.
Engoliria o sapo, agradeceria a boa vontade e faria o que se faz muito bem em Brasília: fritaria o colega em banho maria, dificultando sua vida por outros caminhos. Negaria-lhe verbas e nomeações, protelaria seus pleitos junto ao Palácio e, no que Brasília também é muito competente, iria queimando seu filme com o presidente.
— Esse rapaz é bonzinho, mas é lento — diria por exemplo, até o colega colocar a língua para fora e pedir para sair sem poder comunicar por quê.
Mas a esperteza combinada com a arrogância lhe impediram de se antecipar ao problema, como fazem os diplomatas, por mais inábeis que sejam. Por esses estranhos desvãos da natureza humana, que o poder potencializa, acabou tão inábil quanto o jovem que estava chegando.
gilmarcio diz
Concordo plenamente com você Jaeci, as informações não chegam nos maiores meios de comunicação né “REDE GLOBO”, assim como o envolvimento do Jose serra tambem ministro deste golpista esta sendo acusado de propina de aproximadamente R$25 milhões ,esse Meirelles também ministro que junto com o Golpista Temer e companhia foram acusados pela compra de votos PMDB com a grafica do Meirelles e aí por diante, esses que estão aí no governo estão querendo fazer a reforma da previdencia, a Tal “Pec”, ai eu pergunto a vocês: ESSA CORJA TEM ALGUMA MORAL,ÉTICA PARA MUDAR ESSE PAÍS? BRASILEIROS, VAMOS ACORDAR, ACABOU A DILMA,ACABOU O PT, VAMOS PREOCUPAR COM ESSA CORJA QUE ESTA DESMORALIZANDO CADA VEZ MAIS ESSE PAÍS, EMPRESÁRIOS NÃO CONFIAM MAIS NESTA GENTE(VELHOS VERMES DA POLITICA),VAMOS DÁ UMA BASTA NESTA GENTE, VAMOS PARA GUERRA,QUEREMOS PESSOAS QUE REPRESENTAM A CLASSE,POBRE,CLASSE MÉDIA E A CLASSE RICA QUE PENSA EM UM PAÍS JUSTO PARA TODOS, NÃO VAMOS PERDER,A LUTA É DE TODOS,NÃO ADIANTE VOCÊ EMPRESSÁRIO ACHAR QUE VAI SER BENEFICIADO,POIS NÃO VAI,VOCE E SEUS FILHOS COM ESSE GOVERNO NÃO VÃO TER SEGURANÇA CONTRA ESSA VIOLENCIA QUE ARRONDA ESSE PAÍS,ELES SIM OS “VELHOS VERMES POLÍTICOS” PENSE NISSO, VOCÊ TAMBEM VAI SER PREJUDICADO. VAMOS A RUA,VAMOS APOIAR OS ALUNOS,OS PROFESSORES E TODOS AQUELES QUE ESTÃO SOFRENDO COM ESSA CRISE DO PAÍS,POR CAUSA DESTES VERMES,
jfer diz
Oi. Está análise está terrível. Basta comparar com países decentes, com ou sem diplomacia, e este cara estava na rua e processado. Sugerir posturas diplomáticas onde está patente a corrupção é sugerir jogar para debaixo do tapete todas as falcatruas dos políticos brasileiros. Nesta toada você deve concordar com anistia ao caixa 2, e demais propostas que estão sendo gestadas no nosso escandaloso congresso.
Carlin de venda nova diz
Se fosse noutro tempo e ocorresse fato idêntico, ele não receberia esse tipo de tratamento. Qualificações diversas em nome da moral e das” pessoas de bem” (bem?) estariam pululando.
Como é num “novo governo” em que a “imaturidade tromba com a prepotência e a inabilidade de ambos provoca um estrago na imagem e no andamento da administração”, podemos dosar a pílula.
Esse texto é o exemplo do trato da mídia nacional sobre os fatos políticos.
Aos políticos amigos tudo, inclusive fazer vistas grossas aos seus mal feitos, tráficos de influência, assalto à ética e corrupções. Aos adversários a execração pública.
É a ópera bufa da imprensa nacional, com raríssimas exceções.
Antonio brandão pereirai diz
E dizem que teria formação de diplomata! Que fez da diplomacia?
Afonso Lemos diz
Outra coisa, esse governo Temer é uma graça, vive apresentando figuras bizarras à sociedade. Esse aí é um exemplo dessas ações desse novo “governo”. Temer quem que demitir esse “suíno”.
Afonso Lemos diz
Ainda bem que foi uma análise da política de países que demandam ações divinas. Se fosse uma aula, meu Deus, eu teria que concordar e muito com o Dalton, com o Pedro, com o Jaec, com o Maurílio, com a Waleska, com a Maria Lúcia e com o Cristiano. Ainda bem que foi apenas uma análise !!!
Cristiano Marques diz
A verdade é que Geddel não comprou, ele ganhou o apartamento.
Temer não quer demiti-lo mas vai ter que fazer.
A contragosto mas vai.
Maria Lúcia diz
Que despudor! Que conselhos torpes! Acho que o nobre jornalista anda meio misturado aos porcos…
Diplomacia exclui transparência? A velha política da trapaça!! Podre!!!
antonio henrique medeiros diz
Concordo em muito do que foi escrito neste artigo, entendi perfeitamente que o objetivo foi o de colocar frente a frente os dois ministros e, entre eles, o presidente da república e os “conchaves” políticos que temos certeza que existem no Brasil Faltou ao menos citar os erros cometidos pela construtora em desejar construir em área imprópria e, principalmente, dos responsáveis no governo municipal baiano que permitiram o empreendimento que, agora, se encontra embargado. No mais, parabéns pela análise.
Melão diz
Aproveitando seu excelente artigo,gostaria de acrescentar mais sobre esse assunto.Todos nós sabemos que os verdadeiros donos do poder, no Brasil,queiram uns ou não queiram outros,são esses burocratas públicos,ou seja,servidores que na realidade não tem o mínimo interesse em alcançar algum tipo de solução para os problemas que tanto infernizam a vida do cidadão pagador de impostos e só pensam no próprio umbigo.Não precisamos de ir longe..Aqui mesmo,em Belo Horizonte,temos vários exemplos:. Alguém que teve necessidade de requerer um corte de árvores,muitas vezes já podre, que ameaça cair sobre sua casa e sua família sabe bem do que estou falando.Depois de passar por várias agruras o tal de fiscal aparece, examina a árvore,sapateia com seus pezinhos delicados o chão à frente do contribuinte ansioso e dá o veredito:não.não e não.O cidadão fica com a impressão de que a árvore em questão é uma vaca sagrada e tem que cair sobre sua cabeça.Isso sem contar o setor de aprovação de projetos,onde cada fiscal é uma prefeitura independente.Ainda tem as capivaras,os moradores de rua,etc.etc.etc.Estou me alongando muito.Um abraço.
waleska henriques diz
Não gostei nem um pouco da reportagem. Muito tendenciosa, um jornalista a favor da corrupção. Ele deixou bem claro que está a favor do Ministro Geddel.
Maurilio Fernandes de Oliveira diz
Vergonha !
Jaeci diz
O impressionante é a diferença de tratamento dos escandalos nos governos anteriores e neste governo. A corrupção explícita revelada ganha outros termos como saia justa, falta de diplomacia, inabilidade. Nojento.
Pedro diz
Concordo com você, Dalton. Que papo furado é esse de tira um andar dali, outro daqui? Também nunca tinha lido o jornalista. Trabalhava em qual jornal antes?
Dalton Andrade diz
tira um andar aqui, outro ali, que papo furado! Tem um conselho inteiro do IPHAN em jogo. Não posso fazer um juízo do jornalista, porque é a primeira vez que o leio, mas não é nenhum pouco promissor.