Isabel Alexandra Maria é chamada de volta de uma missão na África, porque o pai a quem vai substituir no posto, o rei Jorge VI, acaba de morrer.
Basta a notícia chegar por telegrama e tudo muda à volta da menina voluntariosa, diante de quem todos passam a se curvar.
O ponto alto é quando caminha angustiada até os aposentos reais onde está o corpo.
Precisa chorar e esboça o desejo de um abraço da mãe e da avó, mas as duas agora também são súditas que lhe devem obediência e se dobram em reverência protocolar.
A partir daí, na grande série The Crown, sobre a vida de Elizabeth II, tudo me mostra o quanto a realeza inglesa é um fardo para a rainha e todos os que têm a sorte e a desgraça de cair nela.
Como foi com Diana, como foi com todas as plebeias antes dela e como será com Kate Middleton e essa Meghan Markle que acabou de deixar a liberdade lá fora.
Apesar das concessões à mudança dos costumes, mudar para não mudar, ainda se trata de vida de claustro num palácio antiquado, cheio de regras e proibições rígidas de não se exceder em público.
A família real tem que ser, é, o modelo que deve inspirar os ingleses e servir de contraponto à sanha dos políticos.
Daí que é grande simplificação, quase ignorância, dizer que a Monarquia inglesa custa caro e não serve para nada.
Presidentes de repúblicas parlamentaristas, como França, Itália, Portugal ou Canadá, em que o poder é exercido pelo primeiro ministro, poderiam ser acusados do mesmo. Com a agravante de que custam muito mais caro, com seus aparatos, seus vereadores bem pagos, suas eleições milionárias.
A rainha repete o papel dos presidentes em toda democracia: ser o condutor espiritual da nação, em nome de quem fala, em quem os súditos/eleitores depositam suas demandas, esperanças e ilusões. O influenciador do Parlamento a quem compete convencer. Ou, no caso dela, no mínimo, censurar.
Além de gastar muito para manter o aparato das Presidências, com seus séquitos, seus aviões e seus políticos bem pagos, as democracias presidencialistas também escolhem seus reis presidentes a cada quatro anos, a um custo enorme de energia, tempo, dinheiro e muita manipulação.
Nas democracias não parlamentares, como as dos EUA, do Brasil e da Argentina, a coisa é pior.
Além de caras e não terem contrapesos eficientes, que tornam as decisões mais caras ainda, têm eleições selvagens e corrompidas em campanhas à beira de eleger o mais bonito. Suas pequenas margens de votos em favor do vitorioso deixam um país quase sempre dividido e exposto a novas crises.
A Monarquia inglesa cumpre o papel dos presidentes a um custo fixo e sem vestibular/eleições a cada quatro anos. É mantida pela legitimidade popular, que só aumenta, ao contrário da minoria intelectual que lhe torce o nariz.
O filme A Rainha, bonito drama em torno das resistências de Elizabeth II a dar um funeral de princesa a Diana, flagrou o grande momento histórico em que a população, pela primeira vez, ficou contra sua monarca. E somatizou em suas entrelinhas o peso que os ingleses dão a essa representação, o quanto ela serve de contrapeso ao poder civil dos políticos no parlamento.
Só que é sistema irrepetível, inimitável, irreproduzível em outras paragens. As outras 12 monarquias da Europa não têm o mesmo prestígio e não repetem o mesmo padrão.
Há que se ter pelo menos uns mil anos de história e cultura para tentar simulá-la.
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