Sistema de compra de votos em todas as regiões do estado amplia sobrevida de deputados que seriam rejeitados em eleição distrital.
De todas as possibilidades de reforma para dar melhor representatividade, reduzir número de candidatos e reduzir o custo das campanhas, o distritão — volta e meia cogitado e derrotado pelos deputados — é de longe a pior.
Ele faz a conta simples que parece lógica, de que se elegem os mais votados.
Mas, na medida em que beneficia os mais ricos, os puxadores de voto e os aventureiros de auditório em que se incluem de jogadores de futebol a pastores de igreja, acaba com os partidos, despreza as correntes de opinião, ignora os interesses de classe ou locais.
É elitista e aproveita o mínimo de votos, só o da lista eleita. Não à toa, só é adotado em países que ainda estão na Idade Média, como Afeganistão e Vanuatu.
Só caiu no radar do Congresso mais de uma vez, como na penúltima, em agosto de 2017, porque beneficia principalmente a quem já tem mandato e desfruta de base eleitoral e estrutura paga pelo poder público de assessores, cabos eleitorais, instrumentos de comunicação e verbas para viagem.
E só não foi aprovado lá, como na última tentativa em plenário, em agosto de 2021, porque os partidos pequenos partidos obstruíram as votações até acordarem todos um remendo pior, a volta das coligações que pulverizam o parlamento no desastre de dezenas de partidos, sérios ou de aluguel, fulminante para a governabilidade.
Leia meu artigo no Estado de Minas: Presidente é quem menos manda no nosso Subpresidencialismo de cooptação
Como as campanhas ficaram caras e sem patrocínio privado e ainda purgam o desgaste em suas bases eleitorais que vem desde a Lava Jato, eles temem serem triturados pelos candidatos de maior poder aquisitivo. Que, se esquecem, seriam seus maiores concorrentes num eventual distritão.
Estudo divulgado na CBN pelo cientista político Sérgio Abranches, com base no mapa eleitoral de 2014, indica que 91% dos atuais deputados federais estariam no topo da lista de eleitos.
Daí se entende porque sequer admitem a possibilidade de adotar o voto distrital, de longe a mais descomplicada e comprovada forma de reduzir candidatos e custos de campanha, ao mesmo tempo que amplia a representatividade e a legitimidade dos eleitos.
Numa eleição no distrito, uma microrregião que engloba uma cidade média e pequenas ao redor, os deputados são conhecidos e travam uma disputa como a de prefeito. Na medida em que estreitam suas relações com a comunidade, ampliam suas responsabilidades, seus compromissos e seu conhecimento.
É muito difícil que, quatro anos depois, o eleitor não tenha ainda recall de quem elegeu. Ao contrário de hoje, em que a maioria sequer se lembra em quem votou.
Distrital informal
De certa forma, isso já ocorre de forma informal na eleição proporcional em Minas. O candidato nasce e cresce a partir de suas relações comunitárias. O problema é que, quando começa a ser desaprovado em sua microrregião, foge para comprar votos em outras.
O Congresso é cheio de exemplos de parlamentares sem antecedentes políticos, afilhados de deputados tradicionais, que se elegem enviando cheques para prefeitos e cabos eleitorais no estado inteiro. É comum biografias de parlamentares novatos com votos em centenas de cidades, por onde, muitas vezes, sequer passaram.
(Para evitar que a política acabe reduzida a um provincianismo de questões municipais, de estradas a buraco de rua, as democracias modernas inventaram o distrital misto, em que se vota num candidato local e noutro estadual, de uma lista dos partidos.)
É essa composição parlamentar, eleita dessa forma, que tem a responsabilidade de fazer a reforma política que o país precisa. Acossados por cima por quem tem dinheiro e por baixo pelo eleitor de sua região, os parlamentares precisam continuar garantindo o voto do estado inteiro.
Perdi há décadas, mais especificamente a partir da feira livre da Constituinte de 1998, a ilusão de que os parlamentares façam reformas que visem o interesse coletivo. Todas as reformas do interesse da maioria real do país são desidratadas pelo poder de influência e o lobby dos grupos de pressão organizados que têm acesso sobre os parlamentares.
Não poderia ser diferente no quadro em que são eles mesmos os principais interessados.
a diz
Parlamentarismo já.
Jackson Wild diz
Estou de pleno acordo com o comentário de nosso amigo Tiago.
Alexandre diz
Concordo inteiramente com os comentários em relação ao parlamentarismo. Tendo em vista a obcessão brasileira pelo “Fora – quem quer que esteja na presidência”, é um sistema que traria muito mais estabilidade (paradoxalmente) ao sistema político do que o presidencialismo. E uma vez que dependeria de formação de maiorias no congresso, poderia ser bem mais efetivo para a implantação de políticas públicas que, hoje, são eternamente adiadas pelo mais provinciano embate político.
Jackson Wild diz
Precisamos barrar as manobras dos atuais parlamentares para se perpetuarem no poder, porque na verdade eles não nos representam e sim aos seus interesses. Eles não têm nenhum amor à pátria, mas somente aos seus bolsos. Precisamos adotar o parlamentarismo já !.. Vejam a situação caótica em que se encontra o país. Por culpa de quem ?… De nossos políticos !….
thiago diz
Acho que a gente tem que considerar que os deputados federais representam os cidadãos em questões que ultrapassam as questões locais: previdência, tributos, concessões e privatizações, telecomunicações, direito penal, etc.
O distritão não vai impedir a eleição de quem não recebe votos? Isso não é bom? Pode sim enfraquecer os partidos políticos, mas estes já estão falidos e corrompidos. Sou a favor de permitir a eleição de quem não é vinculado a partido político, assim como acontece em vários países; pode ser mais difícil de se eleger sem o apoio partidário, mas pode ajudar a arejar e renovar o sistema.