Como pesquisas, mesmo honestas, podem esquentar ou esfriar Lula

A última Vox Populi que cravou vitória de 44% e 45% para Lula nas simulações de voto contra Aécio e Alckmin (50% e 51% no segundo turno) fez antes das perguntas de intenção de voto algumas de conjuntura para “esquentar o entrevistado”, como se diz no jargão dos institutos.

Não tive acesso ao questionário, mas o dono do instituto Marcos Coimbra admitiu em artigo na Carta Capital que foram feitas perguntas antes sobre o governo Temer e suas reformas. Na matéria no site da CUT que destrincha os resultados, parece claro que também foram feitas antes abordagens sobre os 14 anos de governo do PT, qual o melhor presidente que o país já teve e aspectos da personalidade de Lula.

De onde tirou que ele é: trabalhador (para 66%), um líder e bom político (64%), bom administrador (58%), capaz de enfrentar uma crise (58%), entende e se preocupa com os problemas das pessoas (57%), é sincero/tem credibilidade (45%).

Então é mais ou menos assim:

• você faz uma série de perguntas sobre algo que está péssimo,
• confronta com outras que lembram um passado que a memória coletiva entende como meio paradisíaco,
• emenda com outras favoráveis sobre as quais não há dúvidas a respeito da personalidade do entrevistado e, só então,
• pergunta em que candidato o entrevistado está disposto a votar.

Numa avaliação rápida, considerando-se todos os pré-requisitos e as circunstâncias colocadas, só pode dar Lula na cabeça.

Num dos artigos em que desmonta o preconceito de que Lula só tem votos entre pobres e analfabetos, Marcos Coimbra admite que há uma controvérsia entre os institutos de pesquisa se essa esquentada afeta os resultados.

Para mim, não há controvérsia alguma. Claro que afeta. E, mais do que isso, pode esquentar ou esfriar os números dependendo do interesse e das circunstâncias da hora.

Esquentar a imagem

Tanto que, por precaução, certamente que com ainda dúvidas a respeito, o instituto evita fazê-lo em vésperas de eleição. Coloca logo de cara as perguntas de intenção de voto. Seu principal argumento para não fazer o mesmo longe das eleições é que o número de indecisos e desinformados (“não sei”) seria muito grande.

Nas eleições de 2010, o Sensus resolveu inverter os questionários nesse sentido depois de uma denúncia — e de uma pesquisa divergente do Datafolha — de que a esquentada estaria favorecendo Dilma Rousseff. Como as perguntas iniciais pediam avaliação de um governo que acabava com alto índice de aprovação, era de se admitir que a boa avaliação de Lula influenciaria a resposta em torno da candidata dele à sucessão.

Claro também que não dá Lula na cabeça só por causa disso. Não quer dizer que as pesquisas não captem com bastante precisão a vontade coletiva e nem que os bons números do ex-presidente sejam falsos.

Já se consolidou nos institutos, nos meios políticos e na imprensa especializada, que o ex-presidente tem um patamar consolidado de 30% dos votos (não por acaso, 32% o acham honesto na pesquisa), de onde saiu para vencer duas eleições presidenciais ao arrastar a boa vontade da classe média alta e das elites endinheiradas.

Marcos Coimbra mostra que ele patinou por aí antes de Dilma e descolou dela, para cima, quando veio Temer com suas reformas impopulares e a lama geral revelada pela Lava Jato que pôs todo mundo no mesmo saco. (Não são palavras dele.)

Nem precisava da esquentada, mas é óbvio que ela ajudou.

É preciso se levar em conta também que a pesquisa foi contratada pela CUT, que anda no propósito de criar fatos para esquentar a imagem de herói do grande líder operário, nas vésperas de seu primeiro e perigoso encontro com Sergio Moro, no próximo dia 3.

Duvido que, no briefing com a central contratante, nas atuais circunstâncias, Marcos Coimbra iria propor um questionário começando com uma pergunta tão vaga quanto: “qual a sua avaliação sobre Lula?”.