Para o bem ou para o mal, mais para o bem a essa altura do campeonato, a pressão popular a favor do habeas corpus de Lula, mais a favor do que contra, não modificou em nada o que já se antevia sobre a posição dos ministros do Supremo.
O 6 a 5 de 2016 em favor do cumprimento da pena logo após a condenação em segunda instância, que se redesenhou no início do julgamento do habeas corpus, há duas semanas, se consolidou ontem.
Em relação a 2016, Alexandre Moraes manteve o mesmo entendimento de quem sucedeu, Teori Zavascki, e Rosa Weber o mesmo entendimento de ambos, embora naquele ano tivesse votado contra.
De todos, sem exceção, já se sabia a posição desde a quinta-feira um tanto patética em que a maioria decidiu passar o HC do ex-presidente por cima de outros como solução para não rediscutir o tema de novo através das ADCs (Ações Direta de Inconstitucionalidade) que estão com Marco Aurélio.
Só quem mudou mesmo de lado, de cuja posição já se sabia até mais do que a dos outros, foi mesmo Gilmar Mendes. Ainda assim, por razão inversa ao interesse da maioria. Ele, como se sabe, como Reinaldo Azevedo e Lair Ribeiro, parece ter certo prazer de ir contra a corrente.
>>> Veja esse artigo: Gilmar, Reinaldo, Lair Ribeiro e o risco de afrontar a opinião pública
O site O Antagonista, que milita jacobinamente e sem disfarce contra o lulismo, se jacta de que pode ter ajudado a produzir a mudança, que de fato não houve. O argumento aqui é que, não fosse a pressão popular, o resultado seria outro.
Seria mesmo? Não acho.
Opinião pública por clareza
Não me pareceu que os magistrados tivessem mudado uma vírgula do que acreditavam até duas semanas atrás.
Foi a mesma maioria a favor da prisão em segunda instância, porque não caberia corrigir a decisão do STJ que negara o habeas corpus, como achou o relator Edson Fachin, porque decisões colegiadas devem ser respeitadas, como pregou Rosa Weber, ou porque os tribunais regionais não devem servir apenas de passagem, na tese de Alexandre de Moraes.
Foi a mesma minoria contra, na defesa da prisão só após o trânsito em julgado. Seja porque a Constituição é explícita, como cansou de repetir Marco Aurélio, seja porque o STJ corrigiria os excessos, na tese de Toffoli, seja porque o sistema penal podre de presídios medievais não suporta mais presos, num dos argumentos de Lewandovski.
Sintomaticamente, dos seis ministros contra o habeas corpus, cinco foram indicados por Lula e sua sucessora: Carmen Lúcia, Edson Fachin, Luís Barroso, Luiz Fux e Rosa Weber. Dos cinco a favor dele, três antigos alvos do PT: Celso de Mello, indicado por José Sarney; Marco Aurélio Mello, por Collor; Gilmar Mendes, por FHC.
Pode-se até conceder que a pressão popular possa ter impactado, mas no sentido de ter suscitado maior clareza e justificação dos seus votos.
No meio da maratona de votos looooongos e vastamente fundamentados, em 11 horas de sessão, Rosa Weber estava visivelmente nervosa e Gilmar Mendes, em especial, suou para explicitar suas posições e afastar sua má fama de elitista benevolente com os culpados do andar de cima.
No mais esperto dos votos, bateu duro no PT, a quem responsabilizou por chocar o ovo da serpente da intolerância nas ruas, de forma a tornar mais isento o seu voto que beneficiaria Lula. Bateu na grandes órgãos de comunicação, na Folha de São Paulo e no Jornal Nacional em especial por queimar longos minutos da sua edição da véspera para mostrar um vídeo famoso de suas gritantes contradições a favor e contra a prisão em segunda instância, entre 2016 e agora.
— Não há contradição alguma — foi a linha geral do raciocínio, segundo o qual não há impedimento de que haja prisões, mas que elas não podem ser automáticas, como acabaram se transformando pelo que chamou de empoderamento do estamento dos promotores, dos procuradores e dos juízes.
O impacto suave sobre Rosa Weber e mais pesado sobre Gilmar Mendes, ainda que não tenha mudado outra vírgula de seu entendimento, pode ter sido o máximo que a pressão da opinião pública conseguiu.
O que não é pouco. Se ela conseguir pelo menos clareza e transparência, já está de bom tamanho. Ideal, no futuro, é que não precise estar sempre voltando às ruas quando algo relevante está posto.
Opinião de Carmen
Carmen Lúcia acabou dando um baile no final da sessão, já lá para 1h da madrugada.
O advogado mais atuante de Lula, Batochio, pediu que ela não votasse assim que se deu o empate de 5 a 5, sabendo que seu voto desempataria contra o seu cliente e a manutenção do empate o beneficia. Ela trucou rápido: para não decidir sozinha e absorver todas as críticas, colocou em votação onde tinha maioria. Gilmar fez falta do outro lado.
Aí Marco Aurélio Mello, fazendo o jogo de outro pedido dos advogados, pediu que se mantivesse a liminar que sustava a prisão até que se julgassem embargos declaratórios. Que só tinha sentido até ontem. Fora dada há 15 dias porque o tribunal não pôde concluir o julgamento. De novo, ela colocou em votação e de novo levou.
Revoltado, ele repetiu sua arenga sobre a necessidade de se esperar o julgamento das tais ADCs (Ações Diretas de Inconstitucionalidade) sobre o mesmo assunto, que estão em suas mãos. Mas ela o cortou com elegância e proclamou o resultado.
Foi rápida, suscinta e reafirmou sua convicção que vinha desde 2009 e passou por 2016, as duas vezes em que o Supremo mudou suas convicções a respeito do assunto.
6 a 5 contra o habeas corpus preventivo.
thiago diz
O blogueiro é o guardião (dono) da opinião pública?