O agente da CIA Tony Mendes está absolutamente seguro do que pretende fazer. Ele convence a alta direção da central de inteligência de um plano mirabolante para resgatar seis diplomatas americanos refugiados na embaixada do Canadá, no Irã.
– É a melhor má ideia que tivemos – diz a seu superior ao explicar a proposta de entrar no país em guerra santa contra os EUA como produtor de um filme falso e retirar os compatriotas como seus auxiliares técnicos.
Os seis haviam fugido da embaixada americana, onde 52 colegas ficariam mantidos como reféns por 444 dias, por um grupo enlouquecido contra o asilo dado pelos Estados Unidos ao xá Reza Pahlavi, então apeado do poder na revolução santa liderada pelo aiatolá Khomeini. Eram os estertores e a queda moral do governo Jimmy Carter que iria perder as eleições, também por esse vexame, para Ronald Reagan.
– Eu vou tirá-los daqui, nunca falhei nisso – diz mais ou menos o agente, cheio de certezas, aos refugiados temerosos de entrar num plano maluco onde até mesmo um plano razoável seria de alto risco.
Já a agente Carrie Mathison não tem certeza de nada. Ela está em liberdade condicional por uma ação não autorizada no Iraque e com a paranoia de que um dos fuzileiros navais americanos, feito prisioneiro pelos inimigos, foi convertido pela Al-Qaeda. Estamos nos dias atuais e os Estados Unidos ainda estão batendo cabeça para capturar no Oriente inimigos envolvidos nos ataques de 11 de setembro.
Na primeira temporada, dez anos após o atentado, o sargento Nicholas Brody, resgatado da prisão iraquiana, está de volta aos EUA como herói de guerra, e a agente precisa provar que o país está acolhendo, protegendo e louvando um terrorista camuflado.
O problema é que, claro, ninguém acredita nela. E, para complicar, descobrem que ela faz uso regular de remédio contra ansiedade e transtorno bipolar. A certa altura, pressionada e ameaçada de perder seu emprego, acuada pelo medo de outro taque terrorista dentro do país, desaba em outro de seus ataques de desespero:
– Eles estão dentro de nossa casa e não podemos fazer nada? – blasfema, quase em choro, sem ter certeza de nada.
Por boa coincidência, Ben Affleck e Claire Daines (a cara da Flávia Alessandra), que vivem os dois agentes antagônicos em suas certezas, foram consagrados como melhores diretor e atriz nas duas grandes produções premiadas pelo Globo de Ouro, no domingo, dia 13: o filme Argo e o seriado Homeland, que estreou no início de 2012.
Não deve ser à toa, como nada é à toa em boa ficção e nos prêmios a que ela faz juz.
Os dois agentes traduzem cada qual à sua maneira uma época e um país, com suas certezas, seus medos e suas posturas. Os EUA do agente Tony Mendez, que teria seu ápice na era Reagan, tinha todas as certezas sobre seu direito e dever de comandar a porrete os destinos do mundo. Os EUA da agente Carrie Mathison, após o trauma do 11 de setembro de 2001, tem todas as inseguranças sobre a capacidade de controlar seu próprio quintal.
Dito isso, nem é preciso dizer que filme e seriado são ótimos. Dois grandes suspenses, um político e um psicológico. E ambos sobre um país que, além de suas dúvidas e certezas, também sabe como ninguém patrocinar sua autocrítica.
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