O Banheiro do Papa (El Bano del Papa) é um triste filme uruguaio de 2007, co-produção Brasil-França, sobre a frustração coletiva de um povoado miserável com a visita de João Paulo II, precisamente em 8 de maio de 1988.
Melo é um fim de mundo de terra batida, sem instalações elétricas e sanitárias. Seus habitantes investem todas as suas economias em guloseimas e 387 barracas na expectativa de saírem da miséria com a visita. Esperam uma multidão, composta principalmente de 40 mil brasileiros.
Beto tenta a vida com pequenos contrabandos da cidade de Aceguá, no Rio Grande do Sul, transportados de bicicleta diante de dificuldades e achaques de policiais da fronteira. Resolve aproveitar a visita para pôr fim a seus infortúnios, construindo um banheiro (“Servisio Hijienico”, afixa a placa porcamente escrita). O único decente para aliviar a multidão, presumivelmente empanturrada de comida e bebida.
O problema é que a visita, um discurso sobre o valor da ética do trabalho daquele papa que inventava de ir aos cafundós do mundo vender esperança, durou apenas 15 minutos. Serviu apenas para boas imagens com o presidente uruguaio no palanque maior que o povoado, não atraiu multidões (estima-se que foram 4 mil brasileiros) e provocou efeito contrário ao discurso:
– Trabajo e desarrolho es el carajo – berra Beto, cuspindo fogo, antes de jogar sua bebida na tela da tevê que enaltece o discurso governamental e de uma panorâmica sobre os rostos traumatizados dos habitantes sentados entre seus estoques intactos ou devorados por cachorros e porcos famélicos.
O fiasco da Copa
Não dá para não relacionar com a Copa que vem por aí e as pesquisas que pipocam sobre a expectativa de fiasco.
Comerciantes como os de Melo temem que a farra dos feriados será mais nociva que benéfica para seus negócios e a população em geral anda com a sensação de lesada pela conjunção de incompetência e malversação do dinheiro público.
Como o papa que passa 15 minutos para apregoar o que não sabe sobre uma vida de miséria, a paixão fugidia dos jogos em casa num país desordenado é pouca para tanto sacrifício e já se anuncia fugaz. E já provoca, antes da missa dos estádios, a consciência de não terá valido a pena investir tanto para tão pouco.
Há uma grande diferença entre o Uruguai miserável desse filme sem paisagens idílicas, de atores impressionantes que parecem ter vivido sempre ali, e o Brasil novo rico, meio introduzido no mundo dos grandes.
Entre aquele povoado que parece condenado à miséria eterna e esse gigante com um tipo de riqueza fácil, que combina superfaturamentos, políticos e empresários milionários com hordas de miseráveis por cidades caóticas.
A principal, porém, me pareceu plasmada na cena patética do protagonista correndo contra o tempo em meio à multidão, privada às costas, e em seguida implorando aos fiéis em debandada que usem seu banheiro. É de uma dignidade nutrida de uma certa esperança sem remédio.
O que, por aqui, parece que nem mais resta.
Deixe um comentário