Lista de manchetes com adversativas expõe militância e preconceito da grande imprensa contra a alternativa que Jovem Pan tenta construir

Emílio Zurita, apresentador do Pânico da Jovem Pan, mistura de entrevista jornalística e humor, listou sete manchetes recentes para denunciar como a grande imprensa se utiliza de contraponto negativo (antecedido da clássica adversativa “mas”) para desqualificar as conquistas do governo Bolsonaro:
- “Brasil melhora acesso a escola, mas ainda precisa superar desigualdade, aponta OCDE”,
- “Desemprego recua para 9,3% em junho, mas número de informais é recorde, aponta IBGE”,
- “Itaú eleva PIB para 2% em 2022, mas alerta para desafio fiscal relevante”;
- “Emprego surpreende em maio, mas dúvidas persistem”,
- “Brasil tem menor taxa de homicídios em uma década, mas está entre os dez países mais violentos”,
- “Brasil volta ao 6º lugar em investimentos no mundo, mas retomada é parcial”.
Ao comentar o trecho que bombou nas redes bolsonaristas, o professora Pablo Ortellado justificou em O Globo que os editores assim procedem para não dar munição aos apoiadores do presidente.
Depois de admitir a prática tradicional nas redações de colocar contrapontos para abarcar os diferentes lados da notícia, ressalva que:
— Na atual circunstância, porém, essa prática me parece ter um outro motivo bastante compreensível. Muitos jornalistas consideram hoje grande irresponsabilidade dar uma manchete que possa ser usada como escada para o bolsonarismo, que está corroendo e degradando as instituições democráticas. Assim, para dar a notícia e não se deixar ser usado, inclui-se já na manchete um contraponto.
Tudo bem, mas não reclamem de serem acusados, não só por bolsonaristas, de censura ou militância, que é onde os jornalistas caem quando se arrogam a controlar a repercussão do que publicam e proteger a inviolabilidade de seus títulos.
Como fez, na mesma semana e não por acaso, Vera Magalhães, o alvo preferencial da mais recente temporada de violência contra o jornalismo profissional, liderada por Jair Bolsonaro:
— Algo está muito errado com a democracia quando jornalista vira assunto ou, pior, personagem de uma campanha eleitoral.
Não viram à toa, a se ver na lista de manchetes de Zurita, mas não só. Convém ouvir o outro lado.
Falta-lhes também a humildade de admitir que não estão acima de críticas e que a nobre instituição a que pertencem, como as demais do nosso precário sistema democrático, também passa por um processo indiscutível de degeneração. Não só econômica.
Talvez fosse o caso de dizer que algo pode estar muito errado também com o jornalismo quando seus profissionais viram pauta.
Jovem Pan e Fox News
Não é totalmente aleatório que tenham saído pelo menos duas extensas reportagens sobre o caso Jovem Pan, o mais recente e impressionante fenômeno de sucesso empresarial de comunicação atrelado à onda do bolsonarismo.
Em curto espaço de tempo, uma emissora de rádio obscura e provinciana de São Paulo ganhou musculatura nacional e virou líder de audiência disparado nos segmentos de notícia em rádio, TV a cabo e internet. Sua audiência em canais de notícia no Youtube é humilhante para as outras.
Leia: Jovem Pan vira voz do bolsonarismo com verbas do governo
Como nas escorregadas de Ortellado e Vera, é difícil passar despercebida certa arrogância de tratar o caso de nariz tapado, como exotismo de uma facção fanática e ignorante que só se informa por ela e pelo WhatsApp. Fora algumas maldades, como simplificar a impressionante plataforma de cursos Brasil Paralelo como “produtora de vídeo de direita”.
Falta humildade para admitir que a velha imprensa a que pertencem não contempla grande parte da sociedade que vem há muito tempo se sentindo não atendida por ela. Se levar em consideração o apoio fiel de Bolsonaro nas pesquisas, algo como um terço.
Fenômeno semelhante e já clássico nos Estados Unidos deu na Fox News, criada em 1996 por Rupert Murdoch e a genialidade de Roger Ailes, que viria a cair em desgraça por acusações de assédio sexual, 20 anos depois.
Como havia percebido Olavo de Carvalho aqui, lá nos 90, ele convenceu o empresário de que havia uma grande maioria do país, conservadora, que não se sentia representada — ou até o contrário disso, afrontada — pela relativização moral do jornalismo liberal progressista, maioria do mainstream midiático.
Em pouco tempo e sobretudo a partir da cobertura nacionalista, patriótica e até um tanto xenófoba dos ataques de 11 de setembro, em 2001, fez todas as emissoras de notícias do país comerem poeira. Até hoje.
Muito longe da Fox News, que acalentou mas também contrariou Donald Trump, a Jovem Pan não é veículo que se recomende para quem busca isenção ou pelo menos tentativa de.
Seu carro-chefe, Os Pingos nos Is, é uma chapa branca desavergonhada. Difícil afastar a impressão de que seus três únicos jornalistas críticos ao governo, no restante das 24 horas de programação (Amanda Klein é irritantemente ótima), não estejam ali para cumprir cota e vender o marketing, pouco convincente, de que pratica o contraponto.
Mas, como dizem as manchetes, deveria ser percebida como algo mais do que produto de fanatismo. Por um questão de respeito a si mesmos e ao terço da sociedade não deve ser visto como imbecil.
>Tópicos publicados no artigo Bolsonaro tenta à ultima hora e em vão mudar DNA de encrenqueiro, no Estado de Minas, em 20/9/2022
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