O problema de haver mais militantes que celetistas e capivaras

O país tem 10,5 milhões de trabalhadores com carteira assinada e 15 mil sindicatos. Tem 102 milhões de contas do Facebook e perto de 35 milhões no Instagram e outros 35 milhões no Twitter. E possivelmente todos no WhatsApp.

Donde que, olhando para o lado, sem nem levar em conta os que queimam pneus na cara da PM e os memes com que você topa em cada grupo de WhatsApp dos seus amigos, parece que o país inteiro está contra o governo e suas reformas.

Mais ou menos como o caso das capivaras na lagoa da Pampulha. Chegou um momento em que havia muito mais ambientalistas, militantes e defensores delas do que as próprias. Dava para mandar uma para a casa de cada um e ainda sobrava militante.

Tem professores de universidade, estudantes, funcionários públicos, políticos e índios que nunca administraram um carrinho de pipoca deblaterando contra as reformas trabalhista e previdenciária. Duvido que um parlamentar que tenha tido um negócio e mantido um funcionário celetista iria para frente das câmeras rechaçar a reforma trabalhista verticalmente, como se vê.

Há de chegar o dia em que haverá racionalidade neste país e vamos ter a dimensão do quanto há de oposição séria, responsável e construtiva, interessada em discutir a sério o futuro dos nossos filhos.

Por enquanto, o que se percebe é muita luta política, malandra nas ruas e infantil no grande circo das redes sociais.

O filósofo pop Leandro Karnal conta em um de seus vídeos de mais de milhão de views que, dia desses, um menino de 14 anos o acusou de estar equivocado. O pirralho não considerou em nenhum momento que alguém que estudou por 30 anos a questão da inserção do Reino Unido na União Europeia pudesse ter mais autoridade que ele para falar do assunto.

Nossa cena política está contaminada então por adultos de 14 anos que querem mostrar a cara e colocar fogo no circo, sem bem saber por quê e para quê. Não se apresentam com razões objetivas para enfrentar os problemas.

1. Como afinal vai se acabar com o déficit da Previdência?
2. As simplificações da lei trabalhista são ou não pertinentes?
3. A única solução é deixar como está para ver como é que fica?

Pode até ter gente séria e bem intencionada no meio, mas não é o que parece. Contra os sindicatos, pesa a suspeita de que estão em greve porque não querem perder o imposto sindical obrigatório, uma baba de R$ 2 bilhões. Mas nem um sindicalista se apresenta para defendê-lo e dar uma boa razão de sua existência.

O que leva à discussão sobre se, sendo certa a premissa, se a oposição é movediça e ilegítima, o governo estaria certo? E que toda a resistência contra ele seria falsa?

Oposição dispersa

Não. Há uma séria carência de legitimidade no governo com seus políticos juntos, agravada pela mais funda desmoralização da classe política desde que o rei de Portugal começou a distribuir as capitanias hereditárias.

A grande maioria está mesmo com raiva, decepcionada, olha com desconfiança qualquer coisa que sai de Brasília.

Os professores da rede particular, que desconfiam tanto da CUT e seus pelegos quanto do governo, acharam por bem ficar em casa. Tem um grosso da sociedade fora dos movimentos sociais, atarantada com as reformas, achando que é preciso dar um susto no governo.

E, como em toda situação de crise que encontra seus líderes para explorá-la, essa encontrou alguém ou alguéns para capitalizá-la. Pena que uma liderança maluca, dispersa e um tanto desonesta que omite informações essenciais e usa até índio para protestar contra flexibilização da jornada de trabalho.

Claro que não dá para conversar com quem usa índios e pneus. E nem com os milhões de mouse e celulares em punho no sofá, querendo fazer a revolução.

Falta uma liderança e uma coisa qualquer aglutinadora de consensos que coloque as coisas no lugar e discuta com um mínimo de seriedade nossos problemas.

Alguém que olhe para a câmera — sim, esse é um mundo em que se conversa com câmeras — e diga à sociedade que governos não fazem o mal porque querem, mas porque é necessário. Que nenhum político quer ferrar o cidadão de livre e espontânea vontade. E tenha a humildade de dizer que também tem seus interesses, suas fraquezas, suas idiossincrasias e não faz o mal porque gosta.

Está certo que o Congresso vota como sempre votou, com o consenso da elite que produz, manda e influencia sem fazer alarde. Mas os sindicalistas também estão engessados num modelo de relação de trabalho do tempo de Marx, o filósofo, com um imposto sindical obrigatório do tempo de Marx, o comediante. Sem autoridade para contestá-lo porque não amadurece.

Traduzindo: humildade, para admitir que o governo não presta, mas é o que temos; que a oposição sindicalista, também uma porcaria, tem vontade de ajudar.

Do contrário, é essa barbárie toda que está aí.