Entenda como tirar partido da imitação e de suas influências para aprender a escrever bem e consolidar sua identidade literária.
A melhor fórmula de aprender a escrever bem é imitando quem sabe.
Acontece com todo profissional das oito artes, dança ou música, arquitetura, escultura ou pintura, teatro, cinema ou literatura.
O artista começa numa simulação sutil ou grosseira do ícone que admira, incorpora seus valores e, com o tempo, mescla outros valores de outros ícones e constrói sua identidade.
Você deve ter percebido que a maioria dos apresentadores de TV começa imitando grosseiramente Silvio Santos. Com o tempo, você deixa de perceber Silvio Santos neles, porque foram incorporando outras influências.
Um exemplo mais recente na música brasileira é a cantora Anitta, que começou imitando Mariah Carey e depois foi se diluindo em Beyoncé e Rihana, suas principais influências, até oferecer ao público algo que é Anitta mesmo, uma mistura irreconhecível mas própria.
Na literatura, houve uma legião de grandes escritores brasileiros escrevendo romances reportagem, entre os anos 60 e 70, depois que Truman Capote o inventou em A Sangue Frio, de 1965, sobre a história real de uma família assassinada dentro de casa no Kansas.
O nome melhor para isso é influência. É a soma do impacto dos valores e recursos utilizados por seus mestres que você reproduzirá consciente ou não.
É inevitável. Ninguém nasce sabendo e aprende do nada. Um mestre vai ensiná-lo ou influenciá-lo, intencionalmente ou não.
Os mais medíocres caem no risco do plágio. Os mais brilhantes apreendem a fórmula de seus ídolos e incorpora aos poucos, sem deixar rastro.
Alguém já brincou que o artista criativo é plagiador que ainda não foi descoberto.
Começa com a obra de um ídolo e vai expandindo o aprendizado e a influência para outros. Com o tempo, sua obra própria é uma mescla de várias, em que o estilo alheio não é mais percebido.
É onde se chega na identidade própria. Um misto de natureza imperceptível onde se pode perceber a influência de todos os grandes mestres e ao mesmo tempo de nenhum.
É a sua identidade.
Aos 28 anos, eu ainda tateava na literatura, meio bêbado por um caldeirão de influências, mas já descobrindo meu próprio caminho, a ponto de já confundir quem ousasse me interpretar.
O escritor e biógrafo de Carlos Drummond de Andrade, José Maria Cançado, escreveu no prefácio do meu segundo livro, O Camaleão no Abismo, que “este livro se parece com todos e nenhum”.
Já se consolidava uma identidade, misto da crônica jornalística com da carpintaria literária, produto das influências conscientes de Dias Gomes, Carlos Eduardo Novaes, Fernando Sabino, Luís Fernando Veríssimo, Rubem Fonseca, Gabriel Garcia Marquez e, já nos dias recentes, Malcolm Gladwell.
Aparentemente díspares e contraditórias, fazem sentido na construção de uma identidade que acabou se utilizando da tração do texto romanesco para dar fluência e transcendência à narrativa de vocação jornalística.
Como pode ser visto no texto:
>>> Quem imitei e quem influenciou minha identidade literária para escrever bem
Por que imitar
Influências mesclam seus textos e sua história uma vida inteira.
Mesmo com sua identidade formada e a segurança dos anos de experiência, sempre haverá o que aprender. Sob o risco de se ficar obsoleto.
Você, como o seu texto, nunca está pronto, como o sabem os que vivem desse ofício.
A essa altura, você já foi influenciado de alguma forma e não o sabe. Uma das poucas certezas sobre nós mesmos é não sabemos o que sabemos.
“Só sei que nada sei”, lembra?
Foi preciso que eu escrevesse o artigo de minhas influências para ir resgatando do fundo da memória coisas e sentimentos de que nem desconfiava.
Quem sou eu, de onde vim, para onde vou? — pergunte-se.
O que então pode remeter à pergunta: por que então saber, se é algo no plano do inconsciente, sobre o qual não temos controle?
Entender suas origens, porém, ajuda em muita coisa em se tratando do ofício de escrever.
- Vai ajudá-lo a entender seus objetivos e o sentido do que faz ou pretende no ramo da escrita criativa.
- Fazer o que se domina torna tudo mais fácil e evita uma série de desgastes físicos e emocionais.
- Ter consciência do que se sabe facilita a concentração e o foco no que interessa, num círculo virtuoso de aprendizado.
O educador best-seller Rubem Alves ensina a diferença entre quem trabalha por profissão e quem trabalha por vocação:
…o primeiro trabalha pelo ganho, o segundo seria capaz de pagar para poder fazer o seu trabalho. Trabalha como quem faz amor, como quem brinca.
Rubens Alves
E você ainda pode ganhar dinheiro com isso.
Gurus de autoajuda que vivem disso e os marqueteiros digitais que acham isso defendem que se faça aquilo que se faria mesmo de graça como estratégia de colocar paixão no convencimento.
Ensinar e vender o que se sabe e vender-se em cursos online é hoje um dos ramos mais prósperos do mercado online. Saber escrever uma boa carta de vendas é uma profissão bem remunerada.
Nesse estágio de maturidade, imitar o que outros estão fazendo ajuda, mas ganhará prosperidade com o seu próprio caminho.
Imite a estrutura dos textos
Pode-se dizer que existem diferentes estágios de imitação, dependendo do ponto que você está na carreira, começando, crescendo ou já escritor consolidado.
A imitação pode ser sem medo. Influências são naturais e parte da vida. O que não pode é plágio.
Um caminho seguro para imitar sem plagiar é entender a estrutura e os recursos de quem está sendo imitado. E tentar construir algo igual.
Para isso, quanto mais clássico e tradicional, no sentido de linear a história que vai ser imitada, melhor.
>>>Veja o artigo Uma fórmula simples para estruturar seu texto e contar sua história
Se vai começar do zero, escolha um filme consagrado de que goste, tão linear quanto possível que contenha a estrutura clássica dos filmes de Hollywood, inspirados na jornada do herói, já estudada aqui.
Tente entender a estrutura e identificar os pontos de virada aos 25 e 75 minutos se o filme for de 100, o fundo do poço ou o topo da montanha que estão no meio, a encruzilhada em que o protagonista vai ter que fazer sua escolha, o clímax.
Rocky, um Lutador, de 1978, é um grande exemplo. A história de um boxeador sem chances que vive de bico como capanga de um agiota e lhe cai nas mãos o desafio de enfrentar um lutador de renome, Apolo Creed.
São nítidos os pontos em que ele, pela ordem:
- resiste a aceitar o desafio,
- deixa a vida que tem, na primeira virada,
- vai ao fundo do poço no meio,
- chega à encruzilhada em que precisa se decidir, na segunda virada,
- atinge o clímax da resolução.
O próprio roteirista e diretor Sylvester Stallone imitou a si mesmo e todo o peso de sua dramática história pessoal nessa que é uma das jornadas de herói mais impactantes do cinema, a ponto de sua trilha sonora virar referência de momentos de tensão e vitória.
Ator pornográfico de um filme só, estava na miséria em 1975, a ponto de morar na rua e vender por 25 dólares o cachorro que não podia mais alimentar. Foi o fundo do poço que lhe fez escrever em 20 horas o roteiro que o encaminhou para o grande ponto de virada da sua vida.
Pegue então a história de Rocky/Stallone e elabore uma trama diferente com a mesma estrutura. Um herói tem que sair da sua zona de conforto por uma motivo muito sério e vai ao fundo do poço, de onde sai para dar a sua grande virada.
>>> Veja detalhes dos conceitos de jornada do herói e ponto de virada em O que sua história tem a ver com a jornada e o ponto de virada dos heróis
Como escrevi em Uma fórmula simples para começar a escrever sua história, depois que estiver seguro, subverta.
Se você é escritor consolidado, que busca aperfeiçoar seus talentos e fazer dinheiro no mercado vasto da publicidade, o caminho está em tentar entender sua identidade para vender o que você sabe com autenticidade.
Um bom caminho que aprendi em cursos de marketing digital é, pela ordem:
- Veja de que se tratam ou de qual estilo são os livros e filmes preferidos de sua coleção.
- Sobre que, quais autores e quais temas você gosta de conversar.
- Sobre o quê as pessoas que você admira lhe pedem opinião.
Por experiência, digo que uma forma bem segura é escrevendo um texto autobiográfico como fiz em Quem imitei e quem me influenciou minha identidade literária para escrever bem.
Garanto que você vai descobrir a sua identidade, o seu propósito. Se não adiantar nada e não lhe der dinheiro agora, vai dar prazer e fazê-lo uma pessoa melhor.
[…] Começar imitando é a melhor forma de aprender a escrever […]