À exceção talvez de Batman, sobre quem já circularam todas as maledicências sobre homossexualidade, os grandes heróis de quadrinhos estiveram sempre divididos entre salvar o mundo ou arranjar uma namorada.
Nas versões modernas para o cinema, resolver suas pendengas amorosas parece mais relevante que a responsabilidade pública de guardiões da segurança mundial. E se a identidade secreta foi sempre um contratempo no relacionamento amoroso, agora ela parece mais e mais um fardo, uma tremenda amolação.
Parece ter sido a fórmula encontrada por roteiristas e diretores para dar alguma humanidade a esses heróis maniqueístas por natureza, representantes do bem contra o mal.
Que o diga Tony Stark desse Homem de Ferro III, com seus ataques de pânico e seu jeito infantil de levar a vida inventando novos brinquedinhos eletrônicos. Mais entediado do que nunca com o mundo lá fora e envolvido em salvar seu caso com a secretária. (Se bem que se eu tivesse uma secretária como Gwineth Paltrow, não teria muito conflito de escolha.)
Ele só se mexe quando um bando de ciborgues comandados por um terrorista destrói sua mansão midiática em Malibu. Salvar o presidente dos Estados Unidos nesse imbróglio parece não passar de efeito colateral, risco natural do seu negócio. Um outro tipo de contratempo que ele deixa para seu ajudante.
O grande charme dessa nova versão é esse deboche, um certo ar de que o mundo não tem mesmo jeito e que é melhor se preocupar com o que realmente importa dentro de casa. Emblemático é o tratamento que se dá ao vilão Mandarim, um terrorista meio Bin Laden (Ben Kingsley, maravilhoso) que, vai-se descobrir ao final, não é bem o que parece.
Ou que heróis de quadrinhos são mesmo o que são, uma brincadeira absurda, meio ridícula até, criaturas entre frágeis e patéticas achando que podem salvar a humanidade com suas roupas espalhafatosas e suas mirabolantes engrenagens eletrônicas.
Nessa linha, faz toda a diferença a interpretação inspirada de Robert Downey Júnior, um entediado de carteirinha que transferiu para o filme seu jeito meio cínico de ver e viver a vida.
Com um certo olhar preguiçoso para tudo o que o rodeia, acabou conseguindo dar a ambiguidade e certa grandeza existencial ao seu personagem de lata. E fazendo pela trilogia o que Johnny Depp fez por Piratas do Caribe. Seu pirata de tom efeminado, a princípio rechaçado pelos produtores, deu o corpo e a alma da sequencia.
Leio nos dois grandes críticos, Isabela Boscov e Rubens Ewald Filho, que a direção do novo diretor, Shane Black, deu mais inventividade e humor à sequencia, antes dirigida por John Favreau. Mas Shane Black já javia feito parceria com Downey Júnior em Beijos e Tiros (Kiss Kiss Bang Bang) e sabia muito bem com que material estava trabalhando.
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