Presídio para a maioria dos crimes que não têm intercessão de fronteiras é responsabilidade dos estados. Cabe a eles prender e manter presos, segregar os problemáticos, recuperar os tranquilos e devolver as ruas com um bom grau de dignidade os que cumpriram sua pena.
Por óbvio, cabe também a eles definir a qualidade das prisões, o contingente adequado a cada espaço, a qualificação do policial que investiga, do militar que prende e do carcereiro que guarda.
Os presídios estão como estão porque há anos os governos estaduais não constróem novos, não profissionalizam e integram suas polícias, não dão segurança e valorização adequadas aos carcereiros e, por consequencia, não segregam e não recuperam, muito menos controlam as rebeliões que produzem.
A maioria são gaiolas deprimentes, de gente amontoada em condições do século XV, sem higiene e sem ventilação, onde a tentação de rebelar e matar deve ser mais forte do que a de sobreviver.
E não é por falta de verbas.
Discurso do federalismo
O experiente coronel José Vicente da Silva Filho, secretário nacional de Segurança no primeiro governo Lula, disse em bom artigo na Época que nunca os estados receberam tanto dinheiro para segurança, em ordem inversa à prestação e serviços que ofereceram para produzir o recorde de 58 mil homicídios ao ano, dos quais apenas 8% investigados.
Mas, se você olhar o noticiário, verá que a culpa é do governo central. Por dois problemas antigos:
- Há algumas décadas, para engabelar seus eleitorados, os governadores transferem a culpa de seus fracassos de grande repercussão para o governo federal, sejam suas epidemias de dengue, seus problemas de caixa ou suas rebeliões. Camuflam seus gastos além da conta no velho e gasto discurso do federalismo mal resolvido, que concentraria o principal da arrecadação no governo federal.
- A imprensa influente e de repercussão nacional, do Rio e São Paulo, só pauta Brasília além do seu umbigo. Tem uma dificuldade crônica e ancestral, quase etnocêntrica, de enxergar além de seus estados. Só hecatombes fora do eixo, como a tragédia de Mariana, um estupro coletivo em algum rincão ou um massacre de índios merecem o destaque adequado. Quem torce por futebol conhece bem esse provincianismo que privilegia times cariocas e paulistas. Quem é político sabe que escândalos de corrupção locais só ganham repercussão se tiverem alguma intercessão com escândalos nacionais em andamento.
E um terceiro, que pode se atribuir ao próprio governo federal.
Pressionado, por covardia política para indicar os verdadeiros culpados, inabilidade para lidar com a opinião pública ou pura vaidade (taí o performático ministro da Justiça Alexandre de Moraes), acaba caindo no jogo e vai para o centro do palco.
E, como sempre, prometendo os terrenos na lua que extrapolam sua competência ou não oferecem resultado de curto prazo. Três deles? Construção de presídios federais, envio da Força Nacional em contingente irrisório à necessidade, intervenção do Exército dentro dos presídios.
Sinal de que o governo federal pouco pode — e nem deve — é que o ministro anunciou o quarto plano de segurança nacional inútil em 15 anos. Foram dois no governo Lula e um no governo Dilma.
Todos, por acaso, centrados principalmente em sistemas de inteligência nos estados que passam pela unificação das polícias civil e militar, inimigas figadais em disputa pelo controle da informação que poderia solucionar crimes e desmontar quadrilhas. Como diz outro ex-secretário nacional experiente na mesma Época, o sociólogo Luiz Eduardo Soares, a respeito de termos duas polícias, “somos um caso único no mundo”.
Depois os governadores reclamam. Ou jogam a culpa no governo central. Com a cumplicidade da grande imprensa.
valdir diz
Absolutamente correto o comentário, não obstante se reportar a fatos impossíveis de se jogar por debaixo do tapete. Daí se poder concluir que jornalisticamente se trata apenas de uma análise extemporânea e quem sabe conveniente, afinal de contas o golpe já foi dado.
Cristiano Marques diz
Tudo culpa deste nosso presidencialismo imperial..
O governo federal quer ajudar os estados, responsáveis constitucionalmente pelos presídios, mas, tudo respinga nele.
Nosso provincianismo é incurável.
Edmilson Fidelis diz
Sem ressalvas!