Já vai virando consenso entre estatísticos, cientistas políticos e jornalistas do meio, com base nas últimas eleições presidenciais, que metade do eleitorado se divide entre lulopetistas e anti-lulopetistas. A outra metade vai para um lado ou para o outro, dependendo dos argumentos e dos benefícios recebidos.
É no pé que está a pesquisa de ontem do Ibope, onde os dois lados de duas moedas totalmente diferentes estão quase empatados na marca de 25%. O desafio excitante é saber para onde vai a outra metade, os outros 50% do país que vota.
Se metade das indicações dos candidatos à direita (Álvaro, Alckmin, Amoedo e Meirelles) fosse para Bolsonaro e a outra metade das indicações de meia-esquerda (Ciro e Marina) fosse para Haddad, o jogo se manteria empatado.
Por coincidência, cada conjunto desses somam 16%. Iriam 8% para cada lado. E os dois parecem estar batendo num teto fechado pela rejeição. Embora se diga que a rejeição de Bolsonaro é maior (bateu 46% nessa pesquisa), o próprio diretor do Ibope, Carlos Montenegro, admitiu que a de Haddad pode não ser só 30%. O que vai definir a rejeição no seu campo não é a ele, mas a seu partido, que tem níveis iguais e históricos de fidelidade e rejeição.
Restaria aos outros 25% restantes desempatar a peleja, expostos às muitas variáveis que fazem muita diferença na reta final para arrastar o voto útil: qualidade da campanha, eficiência comunicativa do candidato para convencer e abater ataques baixos, força da militância.
Não dá para prever qual das rejeições vai acabar prevalecendo, numa eleição plebiscitária que se vai votar mais contra que a favor. Os dois candidatos têm algumas virtudes, muitos defeitos e históricos complicados.
Num resumo para complicar a coisa, Bolsonaro é surpreendentemente mais moderno que Haddad em economia, anos 60 em política e século XIX nos costumes. Haddad é século XIX na sua política sindicalista, anos 50 em economia e século XXI em costumes.
Nada dá para saber que banda da sociedade vai prevalecer. A grande imprensa foca muito o debate na macroeconomia, até porque ela resolve mesmo todos os outros problemas quando funciona, mas há questões mais complexas.
O discurso de segurança, negligenciado até as últimas eleições, atrelado à ideia de ordem num país degradado, é forte ativo de Bolsonaro. Todo mundo quer poder voltar a andar nas ruas, mas não se sabe o tamanho da população que aceitaria os efeitos colaterais do excesso de ordem que o ex capitão do Exército cultiva.
O discurso social e do desenvolvimentismo com dinheiro do Estado, padrão Getúlio Vargas e Dilma dos anos 50, atrelado a um discurso de volta ao paraíso, é o ativo de Haddad. Todo mundo quer voltar a tempos de bonança, mas não se sabe o tamanho da população disposta a aceitar os riscos de gastos sem lastro e tentações autoritárias do partido que gosta do modelo Venezuela de gestão.
Já velho para querer qualquer coisa e acreditar em bruxas, não temo nenhum dos dois e nem espero que vão tirar o país do atoleiro.
Qualquer dos dois que ganhar acabará se ajustando à nossa lógica mais ou menos de tocar as coisas, fazendo alianças para amenizar seus excessos. Bolsonaro será ajudado pela direita que o apoiará. Haddad vai fazer alianças com a direita sem a qual não governa.
E ambos terão oposição dura. Estimo que a do PT será pior, porque é especialista em emperrar governos, inclusive os seus. Mas não se subestime do que a direita maldosa no Congresso é capaz.
No resumo da ópera, nossos sistemas degradados por décadas de escolhas erradas — educacional, policial-judicial, burocrático-administrativo — precisam de pelo menos um século para serem consertados. Se se começar o fazer o certo agora.
Os riscos que ambos apresentam, que se colocam diante da metade do eleitorado que ainda não se decidiu, são/serão passageiros.
Pancadaria estaciona Bolsonaro
A pancadaria de Alckmin e Ciro tinha estancado a subida de Bolsonaro, quando ele estava com 22%, antes da facada. É possível que tenham contribuído com o estacionamento dele agora, em 28%, na Ibope.
Mas não se descarte o estrago da volta da CPMF atribuída a Paulo Guedes e a nem a declaração de que lar sem pai é fábrica de marginais, atribuída numa simplificação tipo fakenews ao vice Mourão.
Até porque, aparentemente, Alckmin e Ciro não ganharam nada jogando pedra na vidraça alheia. Como Bolsonaro, ficaram onde estavam: 8 e 11.
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