Duas boas ideias sobre internação compulsória de drogados e redução da maioridade penal para menores criminosos, inter-relacionadas e no centro das discussões do combate à violência:
1. O jornalista Elio Gaspari lembrou em sua coluna reproduzida em alguns jornais de domingo que 26 estados americanos punem o menor como adulto em caso de reincidência, através de leis conhecidas como “Três chances e você está fora” (“Three strikes and you are out”).
– De uma maneira geral funcionam assim: o delinquente tem direito a dois crimes, quase sempre pequenos. No terceiro, vai para a cadeia com penas que variam de 25 anos de prisão a uma cana perpétua. Se o primeiro crime valeu dez anos, a sociedade não espera pelo segundo. O sistema vale para criminosos que, na dosimetria judiciária, pegariam dois anos no primeiro, mais dois no segundo e, eventualmente, seis meses no terceiro.
2. O ex-presidente da Colômbia, César Gaviria, defende o fornecimento de drogas sob controle pelo Estado, como faz Portugal, como forma de desmantelar o lucro e o grande negócio do narcotráfico. Ele é membro da Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia, que inclui os ex-presidentes do Brasil e do México, Fernando Henrique Cardoso e Ernesto Zedillo, e tem a autoridade de ter enfrentado os cartéis de Calí e Medelín, de índices escandalosos de 300 mortes por 100 mil. Diz que o Brasil está na contramão do que vem fazendo países bem-sucedidos no combate às drogas, ao insistir na criminalização que entope os presídios, onde a droga continua sendo consumida, e não no tratamento como uma questão de saúde:
Na Suíça, se o viciado não foi capaz de abandonar a droga e tem uma vida produtiva, o Estado fornece a morfina, e ela vai trabalhar todos os dias. A sociedade tem de ser prática. Esses programas não podem ser administrados com moralismo e preconceito. É melhor que o Estado forneça as drogas aos viciados que não se recuperam e não respondem ao tratamento do que ter meninos assaltando pelas ruas do Rio e de São Paulo para conseguir dinheiro e comprar drogas.
As duas propostas parecem opostas, prender versus amparar, mas o principal de ambas é tentar minorar a alta carga de paixão dos discursos incorporados pela mídia, apesar de contaminados por ideologia, preconceito ou defasagem histórica.
A questão da chamada redução da maioridade penal tem forte oposição da dita maioria intelectual, que lutou pela aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, há mais de 20 anos, e insiste em tratar a violência como uma questão de pobreza, apesar de todas as evidências em contrário. Estão defasados em relação ao contexto em que o ECA foi aprovado, em que se saía da ditadura, a polícia era truculenta contra negros e favelados e repressão do Estado era confundida com tortura.
A descriminalização das drogas, única que a meu ver tornaria do dia para a noite o tráfico num mau negócio, enfrenta, por oposição, a resistência da grande maioria não necessariamente letrada, religiosa e simplificadora. A que confunde vício com pecado, drogado com criminoso e que o Estado não deve tratar de vagabundo. FHC foi esculhambado nesse meio, recentemente, ao defender a liberação da maconha.
Ambos os lados têm em comum a solene omissão dos políticos, que resistem a colocar o tema em suas pautas. Pela covardia de não querer se passarem por repressores para os intelectuais ou por pecador para as massas. Ou pelo oportunismo de, opinando, abrir o flanco à crítica de seus fracassos.
Nenhum outro tema de política pública no país parece ter construído um histórico de fracassos e omissões tão grande como esse.
(Os textos citados estão neste link e neste outro . Ambos podem pedir senha de assinante do jornal.)
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