Poder político – Quando Lula começou a fazer alianças com o pior do coronelismo nordestino, no início do seu primeiro governo, proliferaram artigos de pensadores de respeito de que é impossível governar sem negociar com as forças da direita atrasada no nosso presidencialismo de cooptação.
Tal avaliação partia da premissa de que havia uma esquerda moderna, afinada com as necessidades de modernização da sociedade através da incorporação das camadas populares às políticas públicas e às instâncias de poder.
Mas, desde o fracasso do governo Dilma Rousseff e os primeiros passos das reformas de Michel Temer, tem ficado claro que qualquer tentativa de modernização do estado brasileiro passa por negociar com uma esquerda também atrasada, com os pés fincados no intervencionismo e no sindicalismo dos anos 50.
Nas últimas semanas, contemplando especialmente a farra dos senadores da oposição na derrota da reforma trabalhista na Comissão de Ação Social do Senado e, depois, o protesto de cadeira das senadoras na votação final em plenário, pensei que, para o cangaço da direita coronelista do nordeste, existe o cangaço da esquerda pelega dos sindicatos.
(Um jornalista de O Globo apurou que a senadora Gleisi Hoffman, presidente do maior partido de oposição, consultava por telefone o presidente da Central Única dos Trabalhadores até que ponto deveria resistir sentada no emparedamento às escuras que desmoralizou o Senado.)
Essa esquerda parada na CLT de Getúlio Vargas parece não ter visto o tempo passar: a Globalização, a extinção das fronteiras comerciais, a internacionalização dos contratos, o teletrabalho, o outsourcing, a offshoring, a cadeia mundial de suprimentos e toda a modernização da cadeira produtiva que impactaram para sempre a organização do trabalho.
Uma destruição criativa que permite a um empresário de Betim contratar um designer na Itália, uma bordadeira em Istambul, uma manufatura na China e mandar tudo num container para uma empresa de logística no Canadá, enquanto conversa com seu consumidor através de um telemarketing na Índia.
>>> Veja meu artigo: O caso da Índia e porque vamos perdendo todos os bondes da história
Iguala-se nesse sentido à direita de paletó de quatro botões cuja grande política de investimento no país é pendurar os cabos eleitorais — “militantes” no caso da esquerda — na folha do Estado e impedir qualquer reforma que mexa no seu monopólio. Não extinguir o imposto sindical parece ter sido sua demanda mais importante.
Poder da comunicação – Embora tenha tomado partes do Estado há menos tempo, na ascensão que lhes conferiu os governos de Lula e Dilma, foi voraz o suficiente para contaminar de alto abaixo a estrutura estatal, aparelhar as agências reguladoras que pretendiam modernizar nosso capitalismo do século XIX, financiar com dinheiro público seus aliados na grande indústria e nos movimentos sociais, inchar a máquina pública e dificultar — ou mal se empenhar por — qualquer tentativa de racionalização.
Parece ter conseguido em menos de 13 anos o que a direita levou pelo menos uns quinhentos. Só não conseguiu, embora tenha tentado, controlar os principais meios de comunicação e o arcabouço institucional da democracia representativa e de livre mercado, um tanto consolidados na alma nacional nesse tempo.
Abatida mas não destruída pela condenação criminal de seu principal líder e catalisador, essa esquerda vem acenando para o risco de ruptura institucional se a condenação implicar em sua marginalização do processo eleitoral.
É um exagero e não sei como isso pode se dar.
Mas é certo que, qualquer solução eleitoral a vista tem que incorporar essa larga faixa de descontentes capaz de tomar as cadeiras de um poder da República e impedir que ele funcione.
Alguém disse certa vez que a transição política da ditadura para a democracia no Brasil teve a particularidade de ser pacífica por incorporar os descontentes. Em lugares onde não foi, os descontentes caíram na marginalidade e criaram grupos terroristas. Como na Colômbia das Farc, para ficar em um exemplo.
Não acho e desejo que se chegue a tanto, por aqui. Mas o tamanho do rancor dos líderes dessa faixa sinaliza que, se seus membros não aceitarem o resultado ou, menos que isso, não se sentirem agrupados na nova ordem, vão dar trabalho. Muito trabalho.
Articulação política
Temer fez, como se diz em bastidores, barba, cabelo e bigode. Atravessou o rubicão da reforma trabalhista e venceu duas vezes a difícil revolta ensaiada na Comissão de Constituição e Justiça que viria a cassá-lo. Não é um fraco.
A que preço, já sabemos. Como está com tudo, poderia ter articulado para não cair num número tão redondo: 40 deputados a seu favor.
O número sempre sugere comparações ruins.
Jogo de poder
Em Washington, Rodrigo Janot continua insistindo na autocrítica pela metade, que consiste em dizer que deu imunidade total a Joesley Batista pelo alta contrapartida de denúncias de crimes que lhe foi oferecida.
A questão principal, porém, é que negociou mal.
Na pressa, esqueceu de avaliar que o criminoso envolvido em quatro operações policiais de grande porte acabaria preso e abrindo o bico de qualquer jeito. Ou duvidou da capacidade de investigação e pressão de seus subordinados.
Goodfella diz
pessoas inteligentes ainda operam com conceitos de direita e esquerda…quando tudo não passa que guerra de quadrilhas pelo dinheiro do povo…vai entender.