Reação ao trumpismo, ascensão do pensamento progressista e mudança no eleitorado deu maior diversidade ao prêmio que traduz a América
Há umas três décadas, anos 90, o Oscar era todo branco e másculo.
Prêmios a mulheres e negros em funções importantes eram exceções, como naquelas propagandas de publicidade que colocavam um negro como cota.
É uma reviravolta impressionante que, em tão pouco tempo, ele tenha ficado mestiço e múltiplo, como foi o de ontem. E acenado para uma América mestiça muito antes do que as previsões dos antropólogos.
Uma mulher e chinesa (Chloé Zhao) ganhou os dois principais prêmios, de direção e melhor filme. Outra e coreana (Youn Yuh-jung), a Fernanda Montenegro da Coreia, o de atriz coadjuvante, passando por cima de nada menos do que as grandes branquelas Glenn Close, Olívia Colman e Amanda Seyfried.
Outra mulher (Emerald Fennell) ganhou pela primeira vez o de roteiro original. Um negro (Daniel Kaluuya), o de ator coadjuvante. Um personagem negro no mundo do jazz ganhou pela primeira vez a melhor animação (Soul).
Quase foi possível duvidar que um branco clássico, como Anthony Hopkins, fosse levar a hoje categoria mais badalada, de ator. Havia uma badalação pelo extraordinário e morto precocemente Chadwick Boseman, que havia arrebentado em Pantera Negra e agora em A voz Suprema do Blues.
É bem possível que o que resta de hegemonia branca esteja com seus dias contados. Que atores, diretores e roteiristas brancos terão que suar muito para não serem exceção, como foram no passado recente atores e diretores negros como Morgan Freeman ou Spike Lee.
Tem muito de reação ao trumpismo branco e reacionário contra minorias e também à ascensão lenta e persistente, anterior à isso, do pensamento progressista nos meios influentes, nas últimas décadas.
Mas teve algo mais determinante e mensurável, que foi a mudança na composição dos eleitores do Oscar. Antes restrita aos Estados Unidos, expandiu para coletar votos de personalidades da indústria do cinema no mundo todo.
O Oscar assumiu que deixou de ser estadunidense. Futuramente, o Oscar de filme estrangeiro deve perder o sentido, por exceção.
Como bem lembrou Artur Xexéo, no seu comentário na transmissão da Globo, num contexto desse, em 1999, Fernanda Montenegro teria levado o Oscar de atriz por Central do Brasil, mais ou menos como ocorreu com a sua congênere da Coreia.
Naquele ano, ainda ápice do Oscar branco, másculo e americano, ganhou a desminlinguida Gwyneth Paltrow, de Shakespeare Apaixonado.
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