Por
Marcos Nogueira (*)
Ao vislumbrar que as chicanas de advogados contra a delação da JBS e da Lava Jato podem estar encontrando eco no STF, o procurador-geral da República Rodrigo Janot trouxe de volta, no julgamento desta quarta-feira, uma expressão que certamente só quem tem mais de meio século de vida saberá entender a origem e compreender o exato significado: o ‘salto triplo mortal de costas’.
Essa era a manobra máxima que a trinca de trapezistas dos velhos circos executava e que era alardeada em (muito) alto e péssimo som nas passeatas que a trupe fazia ao chegar a qualquer cidade do interior, para atrair os espectadores. A manobra foi também imortalizada no filme Trapézio, um hit que reunia no elenco Elizabeth Taylor, Tony Curtis e Dean Martin. No caso brasileiro, a única atração que concorria com o salto mortal dos trapezistas, para atrair espectadores, era o ‘globo da morte’, raro nos mais mambembes, por exigir equipamentos caros.
O que atraía os espectadores no salto mortal? O risco.
Talvez tenha sido essa a intenção de Janot ao usar a expressão para advertir ministros do Supremo sobre a decisão que estavam tomando [e que ainda não tomaram]: o risco.
Risco de jogar na lata de lixo todas as delações premiadas feitas até agora nos procedimentos da ‘Operação Lava-jato’ e que têm sido as principais responsáveis por revelar aos brasileiros o que estava por trás, há muito tempo, das principais decisões econômicas e políticas que interferiram em suas vidas.
Quem pensava que as isenções fiscais concedidas às indústrias — em especial as montadoras de automóveis — durante muito tempo tinham como objetivo estimular a criação de empregos, descobriu agora que não, não era bem assim. A real motivação era aumentar o lucro da montadora, para que esta repassasse ‘algum’ para a campanha ou para o bolso de alguém.
Quem de nós alguma vez sentiu até orgulho de ver uma empresa ‘genuinamente brasileira’, criada por alguns caipiras de Goiás, transformar-se na ‘maior produtora de proteína animal’ (bonito isto, não é?), descobriu agora que ela nem era tão genuína assim e que a grana que investiu não era dos caipiras, era mesmo do nosso pobre dinheirinho e serviu para abastecer malas entregues em restaurantes ou comprar ‘predinhos’ em Belo Horizonte.
Quem alguma vez sentiu-se orgulhoso de ver o país estar perto de entrar para o clube dos maiores produtores de petróleo do mundo, descobriu agora que esse discurso publicitário só estava alimentando o repasse sorrateiro de recursos para refinarias e complexos petroquímicos jamais construídos e que só serviram de biombo (ou ‘cunha’?) para repassar grana a partidos e políticos.
Tudo isso só veio à tona com as delações premiadas. E talvez faltem alguns capítulos dessa novela e é bom esperar por eles, antes de se pensar em ‘botar um freio’.
Voltando ao trapézio, ou melhor, ao plenário do STF, convém fazer um reparo à citação do Janot. Um reparo não, um complemento.
Muitos circos e muitos trapezistas conseguiram dar os tais saltos mortais triplos. Mas todos os trapezistas trabalhavam com redes a protegê-los de eventuais e indesejáveis quedas fatais. No caso presente, não há redes protetoras. Janot deveria, portanto, ter dito: ‘salto mortal triplo, de costas e sem rede’, como diziam os propagandistas dos velhos circos que povoaram a infância dos que têm mais de meio século. De vida.
(*) Marcos Nogueira é jornalista colaborador deste site. Eu acrescento que Janot pode estar até muito certo, procedem todos os seus argumentos em defesa do respeito ao negociado entre procuradores e delatares, mas o puxão de orelha do Supremo deve fazer algum efeito. A partir de agora, duvido que ele faça delações nos mesmos termos vantajosos que fez com o dono da JBS.
Opinião pública no processo
Nas vésperas das sentenças de Aécio Neves no STF e de Lula em Curitiba, os advogados de ambos — Cristiano Zanin e Alberto Toron — compareceram com artigos laudatórios na página de Opinião da Folha de S. Paulo.
Tentam convencer pelos jornais o que não têm conseguido nos autos.
É uma curiosa institucionalização da defesa fora dos processo e um indício de que os advogados podem estar achando que, tanto quanto o Judiciário, estão precisando usar a opinião pública para fazer valer suas teses.
Coerência política
Mandou bem o senador Eduardo Amorim, do PSDB do Sergipe, um dos dois responsáveis pela derrota do governo na Comissão de Ação Social que derrubou ali a proposta de reforma trabalhista. O outro foi Hélio José, do PMDB do DF.
Disse que nunca escondeu sua posição do partido e que tanto o partido quanto o governo sabiam de antemão que ele votaria contra.
— A minha decisão de votar contrário à reforma trabalhista não era novidade para o meu partido. Os líderes sabiam da minha posição contrária. Votei de acordo com a minha consciência. Não poderia apoiar a reforma da forma como está.
É um caso raro de convicção mesmo, no Congresso.
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