Se Donald Trump fosse um candidato menos polêmico que Alexandre Kalil, com suas declarações estapafúrdias contra imigrantes e mulheres, sua declaração de renda suspeita e suas promessas um tanto desconectadas da dura complexidade da máquina pública, ele venceria fácil as eleições polarizadas de amanhã contra Hillary Clinton, a João Leite de lá.
A ex primeira dama, senadora e secretária de Estado é a candidata mais preparada segundo o figurino da tradição que contempla aquele tipo de político talhado na vida pública. Fala sobre geopolítica e os limites do administrador público realista numa máquina e num mundo mais complexos do que o vão discurso.
Por isso mesmo, porém, encarna todo cansaço da população com um tipo de gente que não resolve os seus problemas e parece disposta mais que nunca a apostar num outsider que fale sua língua e simplifique as coisas. Como em Belo Horizonte ou nas eleições Brasil afora, prometa mais do que o mesmo.
Não à toa que nos palanques ele vem puxando, com enorme sucesso, o coro “Vamos drenar o pântano de Washington”. Que corresponderia no Brasil a “acabar com a lama de Brasília” ou, em Belo Horizonte, como diria Kalil, “limpar a prefeitura de políticos e apaniguados”.
Hillary tem contra ela apenas o uso mal explicado de seu email pessoal para disparar mensagens de trabalho na Secretaria de Estado. Como João Leite, sobre quem não apareceu denúncia séria mas que acabou incorporando todo o mal estar com uma classe política degradada, ela se afigura por desonesta, pouco confiável, a cada vez que o FBI dá uma entrevista sobre essas apurações.
Donald Trump, como Kalil, é o homem errado na hora certa, que saltou de azarão rejeitado dentro do próprio partido a possível presidente eleito, cavalgando a má vontade contra ela, sua classe e suas mentiras. E, como ele, com um grande talento para culpá-las pela degradação das condições de vida.
Instinto marqueteiro
Há um potente seriado disponível na Netflix, American Crime, que dá boa pista para entender esse mal estar da civilização americana.
A grande Felicity Huffman, uma das mães do seriado Desperate Housewives, encarna toda a angústia do americano branco médio diante da leniência das autoridades de uma pequena cidade de fronteira com o México contra os suspeitos do assassinato de seu filho, seguido do estupro da nora, e os negros e imigrantes na primeira fila de seus suspeitos.
Num ambiente tenso de tolerância velada e relacionamento mal resolvido com a população de negros e imigrantes em sub emprego, ela solta imprecações politicamente incorretas amaldiçoando um país que não sente mais como seu:
— Se fosse o contrário, meu filho tivesse matado um negro, tinha passeata na rua e a polícia estaria fazendo alguma coisa — diz, mais ou menos, a certa altura.
Donald Trump captou como nenhum outro esse mal estar civilizatório de um país que vai amorenando de má vontade, com quase um quarto de votos hispânicos, e vê na imigração o inimigo potencial que ameaça seus empregos, seu padrão de vida e sua segurança.
Com o mesmo talento com que transformou muitos de seus efeitos em características favoráveis, a la Kalil, misturou numa mesma frase racismo, homofobia e intolerância religiosa para atribuir à imigração sem controle parte da culpa pelos atentados terroristas que parecem estar chegando ao país.
E com o instinto marqueteiro de um Kalil ou um João Dória em São Paulo contra os políticos, fez da promessa de construção de um muro na fronteira com o México o ícone para simplificar a ideia de que pode deixar o inimigo lá fora. Que aliás já existe, na forma de uma cerca de ferro monitorada por câmeras e 5 mil homens.
De certa forma, entoa o mal estar da Europa, onde os problemas da imigração potencializados com as mortes de refugiados em alto mar vem abalando as estruturas políticas e provocando reviravoltas como a saída da Inglaterra da Comunidade Européia. E, como naquele tipo raro de alinhamento de planetas, arrasta outros países e continentes.
Sim. O momento Kalil em BH, Brexit na Europa e Trump nos Estados Unidos é reflexo dessa nova ordem, desse mal estar ocidental, que, como sempre, elege um inimigo de fora para acenar com uma falsa tranquilidade dentro de casa.
ramon diz
só que Kalil sempre foi político já participou de várias eleições nao como prefeito nem com cargos mas apoiando candidatos se filiando a partidos etc…ele só fingiu que não era político prá tirar esta capa…aliás ele foi o candidato mais esperto que eu já vi…prá evitar discutir políticas públicas…das quais ele não entende nada…ficou só botando o João Leite pra discutir baixaria e o João caiu nessa…baixaria por baixaria…sou mais Kalil
Marcelo Augusto Nogueira de Freitas diz
Que análise rasa e inconsistente. A Hillary é uma criminosa, traidora e envolvida numa das mais pérfidas conspirações mundiais. Financiada por inimigos do EUA e nunca teve êxito em nenhum dos seus cargos. Sua única vitória foi libertar um pedófilo. Por outro lado, o Trump é um empresário bem sucedido (não um Kalil falido). Muito das mensagens atribuídas ao Trump foram mentiras promovidas pelo establishment mediático e financeiro. Não há nada contra ele (ao contrário do Kalil, que confessou ser ladrão).
lAERTES DUCA diz
Ainda vamos lamentar muito este prefeito eleito. Sem escrupúlos, falastrão, Vai arrumar confusão para todo lado quando pintar greves de professores, médicos, funcionalismo, etc. E pior; se o povo reclamar vai dizer que não prometeu nada e não tem obrigação. Quem viver verá.
Cristiano Marques diz
Crivella é o anti isto tudo e foi eleito no Rio.
Política não é matemática e muito menos receita de bolo.