Os sites dos grandes veículos de comunicação estão se transformando numa geleia de notícias misturadas a anúncios com cara de notícia, que torna difícil para o leitor perceber o que é informação séria e o que se trata de apelação.
Pegue-se uma notícia de qualquer dos cinco nacionais — Folha de S. Paulo, Estadão, O Globo, Correio Braziliense e Veja — e se topará com a abertura de um vídeo de propaganda no meio do texto, uma foto ao lado em forma de notícia que disfarça o anúncio de um apartamento ou, embaixo, um bloco de notas recomendadas em que se misturam o último ato do governo com a última solução milagrosa de algum produto ou especialista.
Já passou a fase dos pop-ups, aquela janelinha irritante que se abre na entrada do site, ou da lista infindável de ofertas na lateral direita. Eles se mantém, mas o carro-chefe agora são os anúncios disfarçados de notícias com o título e a cara de personalidades do noticiário para vender de consultoria financeira a cursos de línguas e planos de emagrecimento rápido:
- “Como o impeachment afetará seu dinheiro”, diz o box com a imagem de Dilma Rousseff ao lado de uma foto de José Serra falando sobre o recurso de Lula à OEA.
- “Ações da Vale chegaram ao fundo do poço?”, pergunta o título sob a logo da empresa, ao lado de “Saiba como investir em Apple e Google nos EUA”, sob foto de Obama cumprimentando Dilma Rousseff. Ao lado, não se sabe bem se se trata de notícia ou guia de beleza a informação de que “Mulher de Cunha tem risco concreto de fuga” ou “Xuxa se despede de seu programa”. De emagrecimento?
- “Oito truques para aprender qualquer idioma sem perceber”, sob a foto de uma moça bonita, está uns centímetros acima de “Na ponte aérea, cadeirante enfrenta elevador interditado.”
Em todos, é quase imperceptível a assinatura do anunciante e a indicação de que se trata de anúncio “Patrocinado”.
Jornalismo de internet
É de revirar na tumba os jornalistas da era pré-internet, do jornalismo de vocação que se arvorava o máximo possível de independência.
Os editores tinham certo orgulho de bater no peito e dizer que as redações eram radicalmente separadas da diretoria financeira, de forma a impedir que interesses comerciais de qualquer tipo contaminassem a isenção dos repórteres.
Com a era do espetáculo e da notícia como entretenimento e depois negócio, ainda nos primórdios da internet, diretores de redação passaram a sentar na mesma mesma dos diretores de finanças, pessoal e logística. Era uma forma de convencê-los de que também faziam parte do negócio da empresa e não poderiam posar de olímpicos idealistas arrogantes.
Para além da internet e sua confusão institucionalizada e absolutamente sem fronteira entre o que é notícia, entretenimento ou informação esperta disfarçada de publicidade, os grandes veículos de comunicação estão quebrando.
Ainda não descobriram — e é possível que não descubram — a fórmula de sobreviver nesse novo modelo de negócios, em que recebem do Google até 1 centavo por clique e têm que competir com sites de quase igual repercussão mantidos por apenas três redatores, como é o caso do vice-campeão de visualizações, O Antagonista.
— É um profundo paradoxo — disse o diretor de Redação da Folha de S. Paulo, Otávio Frias Filho, no seminário comemorativo dos 95 anos do jornal, em fevereiro: — nunca se divulgou nem se leu tanta notícia, mas os pilares de sustentação do jornalismo foram abalados pela transformação tecnológica.
Maior jornal do país, em tiragem impressa e seguidores na internet (quase 33 milhões de visitantes e 308 milhões de páginas), o jornal contabilizava cerca de 140 mil assinaturas digitais de R$ 29,90, ou R$ 4,2 milhões mensais, na ocasião do seminário. Uma merreca diante da superestrutura que o modelo impresso em frangalhos ainda obriga os jornais a manter: jornalistas, fotógrafos, designers, técnicos de informática, apoio operacional circulação, manutenção e administração com suas frotas de caminhões, suas toneladas de papel e tinta.
Notícia e publicidade disfarçada
Acresce que nunca perderam tanta credibilidade também.
O leitor médio tem um pé atrás com tudo o que vê na geleia geral da internet e o mais sofisticado, aquela minoria mais informada que lia jornais no café da manhã, sujando as mãos de tinta, consegue até distinguir o que é notícia do que é publicidade mesmo disfarçada. Mas aprendeu no embate das redes sociais que não existe jornalismo independente. Que a pretensão de imparcialidade dos grandes não engana ninguém, apesar de seus sinceros esforços de mostrar o contrário.
Ambos, não pagam pelo que sabem que conseguirão de graça deslizando o dedo.
O que deixa os conglomerados do impresso na situação cruel de ter que pagar caro para levar informação a um público que quer a informação, mas não acredita nela e nem está disposto a pagar por ela.
A saída é pipocar os sites de anúncios, de todos os tipos. Para ver se conseguem arrastar algum clique de R$ 0,01 para a caixa registradora.