Me programei para escrever sobre O Regresso na véspera da entrega dos Oscar 2016, mas além de ter achado chata a jornada sofrida de 200 quilômetros do herói atrás de sua vingança, não vi ou não tive capacidade intelectual para perceber as razões da badalação que o colocam no centro da festa, com 12 indicações.
É um Oscar certo e merecido para o diretor de Fotografia Emmanuel Lubezki, responsável, mais que o diretor Alejandro Iñarritu, pelos imensos planos sequencia de batalhas sem corte e sob luz natural nas paisagens deslumbrantes do Canadá e da Patagônia.
E outro, discutível mas certo como o sol sobre o orvalho gotejante daquele mundo deslumbrante, de melhor ator para Leonardo di Caprio, a quem o Oscar está devendo uma gentileza depois de algumas esnobadas.
Acho que merece mais pelo sofrimento absurdo de gravar sob vestuário e maquiagem pesada naquele inferno, um tipo de sacrifício que quase sempre mascara a capacidade de interpretações mais sutis e prejudica nossa capacidade de análise.
Para não ficar em um filme específico, tento exercitar o prazer de descobrir as intenções em comum nos roteiros dos oito indicados, produto de uma obsessão mórbida que ainda me mata:
- duas jornadas épicas arrastadas (O Regresso e Perdido em Marte),
- um road-movie elétrico (Mad Max – A Estrada da Fúria),
- três thrillers excitantes (A Grande Aposta, Ponte dos Espiões e Spotlight) e
- dois romances delicados (Brooklyn e O Quarto de Jack.
Mas aí tenho que ter a humildade de reconhecer que não vi todos, talvez os melhores (A Grande Aposta, O Quarto de Jack e Ponte dos Espiões) e gostei muito de outros que não estão na lista: Joy, Carol e A Garota Dinamarquesa.
Esses dois últimos, aliás, haviam me inspirado um artigo que acabou atropelado pela prisão do marqueteiro João Santana, mais excitante para efeitos cinematográficos e mais desafiador para especulações intelectuais.
Eu trataria da entrada de Hollywood na temática da sexualidade indefinida, neutral, que contamina a moda, a publicidade e a cultura, a partir da luta contra o preconceito nos anos 50: das duas mulheres tentando viver seu amor (Carol) e do artista plástico empenhado na primeira cirurgia de mudança de sexo (A Garota Dinamarquesa).
(Que se diga que, menos por alguma revolução estética de seus roteiros ou direção, mas pela beleza sempre intimidade de Cate Blanchet, no primeiro caso, e do desempenho cheio de sutilezas de Eddie Redmayne — o oscarizado que fez Stephen Hawking em A Teoria de Tudo — como o transexual enrustido do segundo.)
Ainda pensei em falar dos injustiçados: esse Carol mesmo, Star Wars – O Despertar da Força (que não é lá essa maravilha, mas merecia mais) e Os Oito Odiados, o faroeste verborrágico de Quentin Tarantino, cujo e deboche e referências do passado parecem ter cansado um pouco a academia.
Tudo somado, acabo por admitir que cronista, quanto não tem assunto, é melhor não escrever. Mas, tendo escrito, o que fazer, senão publicar?
E torcer, como leitor comum que vai ao cinema só para se divertir diante de tanta coisa boa. E conferir as apostas com as estatuetas na noite de amanhã.
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