O presidente da Câmara Eduardo Cunha vem suscitando comparações com Frank Underwood, o parlamentar sem escrúpulos de House of Cards que consegue o que quer usando ou triturando amigos e inimigos na política pantanosa de Washington.
De secretário de Estado na primeira temporada, salta para vice-presidente na segunda e presidente na terceira, com um talento irresistível para fazer alianças, manter os aliados sob controle, virar votações e puxar a escada de traidores.
Cunha tem ou deve ter o mesmo talento.
Só muito carisma, informação, poder de sedução e coragem para pôr e tirar bodes da sala explicam tanta capacidade para, em tão pouco tempo, virar de ponta-cabeça a agenda política nacional e destravar votações de temas adormecidos pelos múltiplos interesses em jogo.
Não se tem notícia de outro na história do país, capaz de chegar a tanto sozinho, carregando a desvantagem adicional de estar na cadeira de um poder historicamente fraco, conduzido como carneiro pelo Executivo desde que foi criado no Império.
Outros como ele tiveram o mesmo poder e a mesma cadeira, mas não fizeram ou conseguiram fazer que queriam ver feito. Para ficar em exemplos recentes, Ulysses Guimarães, José Sarney, Jáder Barbalho e Renan Calheiros.
Por que não? Por que nunca conseguiram esse protagonismo individual para fazer o Congresso empurrar goela abaixo da população ou do Executivo matérias contrárias a seus interesses?
A primeira resposta, mais óbvia, é que foram subservientes, na longa tradição do Parlamento brasileiro, seduzido, comprado ou chantageado pelo Executivo. E, mesmo quando conduziram votações importantes, o crédito acabou sempre atribuído ao Palácio do Planalto.
A segunda – e melhor – é que nenhum deles contou com uma conjunta tão perversamente favorável de esvaziamento desmoralizante do Executivo como a que vive Eduardo Cunha. Circunstâncias semelhantes, como as vésperas do suicídio de Vargas, da deposição de João Goulart ou do impeachment de Collor, tornaram Câmara e Senado maiores, mas não seus presidentes.
O que cai na terceira, mais lógica, que só se explica mesmo pelo talento individual raro dos frank underwoods da política, que sabem muito bem manipular os meios para justificar os fins. Sabem captar momentos cruciais de insatisfação popular causados pelo vácuo e capitanear soluções, ainda que temerárias.
São os tipos que se tornam imbatíveis quando no lugar certo, na hora certa. Quando as populações, meio cobaias e meio atarantadas, mal têm tempo para avaliar se tudo em volta – terceirização, financiamento privado, reeleição – é bom ou ruim.
Deixe um comentário