Na última semana, a grande imprensa publicou extenso material – reportagens, infográficos, análises – com as tradicionais panorâmicas de pátios lotados para dar conta do pior mês de faturamento da indústria automobilística desde 2002.
Nunca vi, mas continuo querendo ver o mesmo sobre a crise cotidiana da própria, a imprensa.
Por azar, na mesma semana, soube-se que os jornais Estado de Minas e O Globo demitiram algumas dezenas de jornalistas e a poderosa Abril, que edita Veja, entregou metade do simbólico prédio que lhe servia de sede, alugado do Fundo de Pensão do Banco do Brasil.
Nem uma linha.
Quem quisesse ler a respeito teve que recorrer aos blogs alinhados com o governo e se satisfazer com sua leitura meio cambeta que enfatiza a questão ideológica como causa principal do martírio dos jornalões e das revistonas: estariam desabando por terem tomado partido.
Novesfora que a Veja tenha mesmo afastado muitos – ou todos – eleitores à esquerda, por conta de sua militância algo panfletária, não é novidade que o eleitor bem informado compra cada vez menos em banca e faz cada vez menos assinaturas, por estar satisfeito com o que acha de graça na internet.
Excelentes revistas da mesma editora, como Exame, também estão indo para o mesmo buraco.
Negócio do impresso está acabando
O problema crucial é que o negócio de jornais e revistas impressos está acabando e sua alternativa de sobrevivência, nos sites, no mesmo tamanho que têm, não é promissora.
Os principais jornais e revistas – Estadão, Folha, O Globo, Veja, Exame, Época etc – conseguiram levar seus leitores para os sites e até multiplicar a sua audiência pelas facilidades multiplicatórias das redes sociais. A Folha tem mais de 300 milhões de visitantes únicos no mês e só Reinaldo Azevedo, colunista da Veja, teve 16 milhões de acessos em outubro.
Só que o modelo de negócios não é transmutável.
Como qualquer pessoa pode ter um site e em tese ser um jornal, os anúncios disponíveis no mundo estão sendo distribuídos planetariamente a todos pelo Google, sem distinção, bastando para isso que comprovem sua audiência por mecanismos difíceis de ser enganados.
No novo modelo, os sites disponibilizam espaços em branco que a máquina infernal do Google preenche com anúncios no preço e no conteúdo que ele determina, segundo o tema do site, a natureza dos anunciantes e o interesse dos consumidores.
Com muito melhor resultado para o anunciante. Você já deve ter percebido que pesquisou um tipo de tênis e, a partir daí, toda vez que abre um site, ele aparece em alguma lateral ou topo. Se houver clique, o cliente do Google, que cadastrou lá seu anúncio, paga e o jornal ou revista recebe.
Estruturas têm quer ser enxutas
O modelo serve bem à loja da esquina ou à multinacional, que paga valores correspondentes ao volume de seguidores de suas páginas, e vai comendo pelas bordas os poucos grandes anunciantes que ainda se interessam por anunciar nas edições impressas de fim de semana.
O segredo do negócio é o resultado, medido e verificado no instante em que o anúncio é clicado, e a um preço pela mercadoria entregue e comprovada.
Tanto o Facebook quando o Google, que cobra para que os sites das empresas apareçam bem colocadas nos resultados de pesquisa, cobram somente por clique. O preço, irrisório para os padrões antigos de publicidade, pode descer a até 1 centavo por ação, dependendo da qualidade e relevância do anúncio.
Jornais e revistas tiveram a ilusão de que poderiam transpor seu modelo de negócio para lá. Só que quiseram, até pouco tempo, cobrar por banners o valor estratosférico que cobram de seus anúncios impressos (mais de R$ 100 mil uma página de domingo), independente de serem clicados.
– Quer dizer: eu publico seu anúncio, você não pode escolher onde, como, quando, para quem, etc, não garanto que alguém vá ver porque não sei se clicaram e você me paga um preço fechado.
E continuam com a ilusão de que podem vender assinaturas entregues em casa num tempo em que tudo está virando streaming, como o Netflix, em que a informação é disponiblizada na hora que é produzida e sempre.
Na nova ordem, eles têm que se submeterem ao preço do clique e ao modelo de fluxo contínuo. Se quiserem sobreviver, adaptarem suas estruturas pesadas ao que sites muito mais bem sucedidos e rentáveis adotaram: um ou alguns poucos jornalistas que precisam apenas de alguns computadores e smartphones.
Fazerem, enfim, o que eles sabem muito bem que empreendimentos em apuros, como a indústria automobilística, fazem quando pátios ou prateleiras estão cheios: demitem.
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