Nacionalista radical contra corrupção e preocupado com o país e os pobres, ética política de Antônio Ermírio conviveu com a contradição de ser acusado de cartel.
Um político pediu a Antônio Ermírio de Morais como condição de apoiá-lo, quando de sua campanha ao governo do Estado de São Paulo, em 1986, uma Secretaria de porteira fechada. O que, no jargão político, significa a autonomia déspota para nomear todos os cargos.
— Mas como eu vou te dar uma coisa que não é minha? — fez-se de bobo o neófito em Política, mas um dos nossos grandes políticos de uma só eleição, que sabia muito bem do que se tratava o terreno pantanoso da ética política no qual havia prometido ao pai jamais penetrar.
A eleição perdida para o populista e depois acusado de corrupção Orestes Quércia foi a primeira, grande, única e desastrada aventura nesse terreno do maior empresário brasileiro que sempre tentou algo fora de suas empresas para intervir na vida pública.
— Foi o pior negócio da minha vida — haveria de dizer, meio rancoroso por ter perdido tempo e dinheiro, sem alcançar o desejo de provar sua competência fora da área privada e ajudar a discutir os rumos do país.
Fosse por uma mal resolvida necessidade de imitar o pai, senador por Pernambuco e ministro da Agricultura de João Goulart, fosse mesmo por consciência ou alguma culpa social traduzida até no jeito de se vestir.
O homem de 25 bilhões da Forbes, segundo dados de 2013, andava de terno esculhambado, gravata mal ajambrada e sapatos baratos, às vezes trocados, pelas galerias populares do centro de São Paulo, onde fazia barba e cortava o cabelo em barbearias de pobres.
Foi suprir sua necessidade de intervir na esfera pública numa defesa quase retrógrada da indústria nacional, a ponto de condenar os companheiros que se rendiam a associações com multinacionais ou investiam fora do país.
Fez seu palanque dessas ideias nos artigos que escreveu por 17 anos na Folha de S. Paulo e nas três peças de teatro que escreveu e produziu com Brasil no nome: Brasil S/A, S.O.S Brasil e Acorda Brasil. Ou fazendo ação social. Cuidou por 40 anos do hospital da Beneficência Portuguesa, com 2/3 de atendimento a deserdados do SUS.
Um grande empresário à moda antiga, senhor de impérios monopolistas de coisas que se transportam em toneladas — aço, papel, cimento —, mas também um cavalheiro à moda antiga, ético e íntegro, que se assustava com cada corrupção dos homens públicos como se a tivesse visto pela primeira vez.
Advogado de uma certa pureza da área privada, nunca conseguiu esclarecer bem as acusações de cartel no cimento, um tipo de clientelismo empresarial, que, só em maio deste ano em que escrevo, resultou numa multa de R$ 1.565 bilhão do Cade.
Em se considerando que o cimento é quase produto de primeira necessidade do povão que sonha com mais um puxadinho na laje, estaria na contradição de ser moralista para a área pública, condescendente com a área privada e cruel com a maioria pobre que desejava sinceramente ajudar.
Essa, o noticiário sobre sua morte, até o momento em que escrevo, ignorou.
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