Dez coisas sobre Marina Silva, a partir do ótimo conjunto de duas matérias e um artigo do excelente André Petry, que expandem a capa de Veja desta semana: Marina Presidente?
1. Seringueira, doméstica, alfabetizada aos 16 anos, venceu a miséria, a malária e a ignorância. Virou professora, deputada, senadora, ministra e líder ambiental respeitada no mundo. Tem tal carisma, um ar severo e beatífico, que provoca silêncio quando chega.
2. Ouvinte atenta, é resistente a mudar da opinião. Convencida, abandona sua ideia, mas leva tempo.
3. Decide lentamente. É alma e reflexo do espírito de seu partido em formação, a Rede, do mesmo DNA assembleísta do PT. Estica reuniões até o limite para chegar a um consenso. Atrasou grandes decisões do governo Lula, como a autorização do cultivo de soja transigência e a construção de hidrelétricas. Mostrava-se convencida num dia e voltava atrás no outro.
4. Apesar de sua pureza ideológica, tem capacidade de articulação e nenhuma dificuldade de se aliar a adversários para atingir objetivos. Fez aliança com José Serra durante o governo FHC para aprovar projetos a favor dos seringueiros. Aceitou os argumentos de Lula de que era preciso fazer alianças com caciques da velha política para governar.
5. Tem desprendimento para alianças e não sataniza a elite: Aceita os interesses adversários desde que claros: “O erro não é ter interesses, é camuflar esses interesses.” E… “discordo, inclusive, de algo que, muitas vezes, a gente debate no Brasil de que o problema aqui é a elite.”
6. Não desperta maiores apreensões no mercado financeiro, porque já repetiu que adotaria a receita inglesa de lorde Salisbury: “os governos existem para manter a sanidade da moeda e a santidade dos contratos”.
7. Como o PT, tem afinidade com os conselhos populares dentro dos órgãos de governo, propostos por Dilma Roussef, criticados por pretenderem tomar prerrogativas do Congresso.
8. Tem muita afinidade com a turma do Fora do Eixo, o grupo que expropriava cachê de artistas e ganhou relevância com os protestos de junho do ano passado. Tem como um de seus luminares alguém muito próximo a ela – Pablo Capilé – que, segundo as maledicências, poderia vir a ser seu ministro da Cultura.
9. Das cinco condições essenciais aos candidatos vencedores nas últimas eleições presidenciais, exceto Fernando Collor, ela só tem uma: carisma. Falta-lhe partido forte, dinheiro, tempo na TV e uma proposta clara. Seus apoios – evangélicos, banqueiros, ambientalistas, economistas ortodoxos – e seu conservadorismo em alguns temas, como aborto, liberação das drogas e casamento gay, tornam confusos seus compromissos.
10. Segundo o sociólogo Antônio Lavareda, ela encarna o desejo de mudança no governo, aflorado nos protestos de junho e que está em 76% da sociedade. Precisará da mídia e continuar se comportando como alguém acima dos velhos vícios. O problema é que terá que fazer alianças com a velha política, como é o caso em Alagoas de Benedito de Lira (ex Arena, PSD, PFL, PTB e atual PP), contra a senadora do PSOL, Heloísa Helena.
PS – Um governo Marina Silva poderia ser a recuperação do equilíbrio da cobertura política de Veja, arranhado nos governos petistas. O tratamento altamente respeitoso do material com ela sugere uma nova relação e uma nova postura. Algo distante do tom muitas vezes panfletário da relação mal resolvida com o partido de Lula.
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