A matéria da Veja sobre a preparação clandestina dos depoentes da CPI da Petrobras transpira alguma ingenuidade de como funcionam as casas legislativas, certa ignorância da natureza das investigações por parlamentares e boa condescendência com a oposição, que tornaria sem efeito toda a orquestração se tivesse presente no plenário.
1. É comum que deputados telefonem para seus amigos convocados para CPIs ou os recebam em seus gabinetes por ocasião de depoimentos. É do ritual dessas casas que uma autoridade em visita, mesmo a caminho do cadafalso de uma comissão, passe pelo gabinete do presidente ou de algum deputado aliado para um café. E é natural, humano e inevitável que ouça alguns conselhos de gentileza e mais respostas do que perguntas:
– Fica tranquilo, estamos todos lá, vão te perguntar isso e aquilo, a gente se defende se te apertarem, etc.
2. Deputados não têm a obrigação da magistralidade distante do juiz, não têm como função a neutralidade imperial de único julgador e não precisam manter sigilo das investigações. Defendem lados e interesses. Podem se reunir com suspeitos e acusados quando e onde quiserem, sem serem acusados de obstrução da justiça. CPIs são políticas e não necessariamente técnicas. Seus relatórios finais podem ou não ser aprovados, mesmo carregados de provas, e não têm poder de punição.
3. Qualquer que fosse a encenação, treinamento ou decoreba dos convocados da Petrobras perderia sentido no contraditório estabelecido em plenário. Essa é uma diferença substancial dos inquéritos parlamentares em relação aos do Judicário. Deputados membros da CPI e quantos outros que o queiram podem entrar e desempenhar o papel de advogado. São vários ao mesmo tempo, e não um de cada lado, sem que a pergunta seja filtrada por um juiz. Difícil que mentiras e dissimulações sobrevivam nesse embate de interesses.
A oposição pode chiar, mas faltou perguntar-lhe porque não estava lá para estabelecer esse contraditório e espremer os convocados até o limite de suas contradições. E é impressionante que anuncie transitar agora por Brasília para denunciar a armação sem que de novo seja questionada a respeito.
Sabe-se que ela, mais por jogada política do que por ignorância da engenharia dessas comissões, abdicou de sua participação nessa CPI sob desculpa de que não pactuaria do que se anunciava uma farsa, desde que o rolo compressor do governo conseguiu aprovar a ampliação de suas investigações, contra os interesses dos tucanos.
Seria preciso entretanto muito boa vontade para admitir que ela não conhecesse a mecânica dos julgamentos políticos que não mudam muito desde que existem. O negócio é estar lá e jogar o jogo.
Tivesse o tom de crônica didática sobre os maus costumes de Brasília, com as mesmas informações, a matéria teria se saído melhor. Colocada entretanto como furo de reportagem, transpirou também alguma coisa de desconhecimento do mundo por onde seus repórteres transitam todos os dias.
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