É dura a vida de Dilma Roussef.
Ela não é a responsável pela nossa maior tragédia atual, a segurança pública, que está nas mãos dos Estados. Ela não era presidente quando a Petrobras, símbolo atual de nossa corrupção endêmica, foi entregue à turba de políticos assanhados. A economia não está pior do que já esteve. Como diz Vinícius Torres Freire, nesse artigo da Folha, vem “desmelhorando” desde 2012, mas em situação muito superior ao passado.
Mas ela parece encarnar a síndica de todas as nossas desgraças, para lembrar a frase clássica de José Sarney quando assumiu no susto e quase de pijama a Presidência da República, surpreendido pela morte estúpida de Tancredo Neves no dia da posse:
– Deus não iria me trazer de tão longe para ser síndico de uma desgraça.
É próprio do caráter de vira-latas dos povos projetar em seus dirigentes todas as suas expectativas e frustrações. E líderes nacionais são feitos desse barro: incorporam e projetam projetos de país em que as pessoas votam, acreditam e defendem. Para o bem ou para o mal, como Hitler, Churchill, Getúlio Vargas, Fidel, Stalin, Kennedy, Tratcher, Ronald Reagan ou George Bush. Para ficar mais perto, o país da abertura comercial proposto por Collor, o da recuperação moral da moeda de Fernando Henrique, o da redistribuição da renda de Lula.
Todos encarnaram uma nova visão de mundo em que a população, em cada momento, aprovou. Ou desaprovou quando as coisas desandaram. E eles sucumbiram ou ajustaram o rumo, como fazem os bons oradores que ajustam o discurso quando percebe a plateia desinteressada ou descontente.
Dilma tem boa parcela de culpa no desencanto, porque queimou fácil e rápido a reserva moral de gerente intransigente e avessa às negociatas do mundo masculino da política.
Prometeu contas de luz e juros mais baixos que não pôde sustentar, tergiversou no confronto desigual com a politicalha de sua base no Congresso e anda contendo os preços da energia e dos combustíveis como um dia o síndico de nossa desgraça anterior congelou todos os preços até as eleições, para praticar o que ficou corretamente conhecido como “estelionato eleitoral”.
Seu problema maior, porém, além dessas firulas que a plateia digere mais não engole, é que ela nunca incorporou um projeto de país. Nunca se soube por que veio, a não ser por escolha voluntariosa da vaidade de seu chefe. Na melhor das boas vontades, pode-se dizer que veio para continuar o que vinha sendo feito pelo padrinho. O projeto é dele. Só que ele não está lá para tocar.
E, mais grave, é que sem o talento de líder, sem a manha do orador, sem a mesma capacidade de mentir para ajustar o discurso e enrolar um pouco mais a plateia quando as coisas desandam, como desandaram. Acaba refém da marquetagem e sua infinita capacidade de empulhação, que os grandes líderes também se utilizam mas sabendo até onde.
A roda ainda gira até as eleições e, como diz quem é do ramo, ela tem dinheiro, caneta e cargos e ainda a única possibilidade de salvação para os que a acompanham. Que, na iminência de morrerem afogados, se juntam. E, nunca é demais lembrar, sem uma oposição à vista que sinalize com outra rapadura melhor do que a que está entregando.
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