Breaking Bad, que fecha nesta semana suas cinco temporadas viciantes, com grande repercussão nos EUA, tem pelo menos seis grandes personagens em atores maravilhosos.
Puxados pelo pacato professor de química Walter White (Bryan Cranston) que começa a fabricar a mais pura metanfetamina e tomar gosto pelo perigo, tem
– seu parceiro drogado e meio grunge Jesse Pinkman (Aaron Paul), que vai lhe criar problemas e com quem vai desenvolver uma curiosa relação de paternidade,
– o cunhado da delegacia anti-drogas Hank Schrader (Dean Norris), com jeitão de Toni Soprano, que vai se afundar na obsessão para descobrir o fabricante atrás do produto perfeito que está sacudindo o tráfico na fronteira com o México,
– a esposa Skyler (Anna Gun) que anda no limite da debilidade emocional para discordar, esconder e conviver com a vida dupla do marido,
– o advogado canalha Saul Godman (Bob Odenkirk) que lava dinheiro sem nenhum conflito ético e emite os mais escabrosos juízos, sem mudar um vinco no rosto,
– o traficante internacional Gus Fring (Giancarlo Esposito) com cara de gerente de lanchonete, dono de uma rede de fast food que serve de fachada à produção e comercialização da droga em escala industrial e onde costuma dar expediente atendendo os fregueses.
Como os melhores personagens da literatura, todos descrevem um arco existencial que começa no desconforto com seu jeito de estar no mundo e passa por um namoro de certa forma prazeroso com o perigo até o ponto sem volta em que se amadurece diante do confronto inevitável com sua verdade.
O professor de química tem um filho deficiente, um câncer terminal, uma mulher grávida e dois empregos para sustentar a família. Descobre na nova atividade ilícita um novo alento para sua vidinha besta e vai tomando gosto pelo perigo em sua escalada para dominar o tráfico e fugir do vazio existencial que vai esperá-lo no final da jornada.
Parece acometido da crise da meia-idade, esgotado com uma vidinha que não valeu a pena apesar de sua luta dentro do padrões aceitos. Mas o jovem drogado com quem desenvolve uma afinidade cheia de percalços também vive o seu inferno.
O excelente Aaron Paul, quase esquecido nas resenhas sobre o seriado, é um poço de ansiedade, angústia, fragilidade, inquietação e, surpreendente, um sentido de ética e fidelidade maior do que o dos outros. Um animalzinho desamparado, desconfortável, ignorante sobre os motivos de sua ambição. Que, vai se ver, tem mais a ver com liberdade do que com ficar rico.
A certa altura, quando enquadrado no modelo industrial de fabricação da droga num laboratório sofisticado – com chefe, expediente fixo e ameaçado de virar empresário para lavar dinheiro –, reclama com os antigos amigos marginais que precisa voltar à sua vida nômade e improvisada de pequeno traficante das ruas.
– Que graça tem estar no crime se você não tem liberdade?
Com eles, o roteirista e produtor Vince Gilligan fez um seriado de extrema potência, eficiente na trama e no suspense, em que só aparentemente trata de pessoas violando as normas legais que as oprimem. Vem sendo comparado muito merecidamente e com algumas vantagens aos criadores de Os Sopranos, o marco da ascensão dos anti-heróis nos seriados americanos.
Lá como cá, trata menos das aparências do que de seres humanos de frente com seus conflitos morais, numa busca meio tonta por uma saída e um sentido na vida.
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