Em que ano nasceu Bill Gates? 1955. E seus parceiros Paul Allen e Steve Balmer, co-fundadores da empresa de software que tornou amigáveis os computadores? 1953 e 1956. E Steve Jobs, o homem que revolucionou a forma como lidamos com eles? 1955 também. Erick Schmidt, fundador da Novell, outro pioneiro da revolução da software? 1955. E Bill Joy, assim como seus três parceiros fundadores da Sun Microsystems, outra gigante do software? Entre 1954 e 1955.
O que há em comum entre eles e o que isso tem a ver com a trajetória que os colocou no topo da maior revolução tecnológica do mundo?
Tem o fato de que, em 1975, quando tinham entre 19 e 21 anos, naquela fase do fim da adolescência em que se quer mudar o mundo, estavam desempregados, procurando o que fazer. Tinham acumulado algumas milhares de horas de programação, madrugada adentro, nas antigas máquinas de perfuração de cartões, do tamanho de uma geladeira ou de um quarto de solteiro, que só existiam nas faculdades.
Aí surgiu o Altair 8000, o primeiro kit de minicomputador que permitia montar em casa um aparelho que poderia competir com aquelas máquinas medievais e restritas a centros de pesquisa. Se tivessem nascido antes, deveriam estar empregados e acomodados numa IBM, a fabricante daqueles mastodontes. Se tivessem nascido depois, estariam novos demais e sem experiência para a novidade.
Foi o típico caso de quando o preparo encontra a oportunidade, que faz a diferença entre o sucesso e o fracasso, tema de outro dos livros instigantes de Malcolm Gladwell, jornalista da The New Yorker. Outliers (Fora de Série) dá vários exemplos e ao mesmo tempo desmonta a tese de que o sucesso depende apenas de esforço pessoal, como nas histórias românticas do sujeito que se fez sozinho. Ele é condicionado por circunstâncias geográficas, legados culturais, herança familiar, influência dos amigos e até de questões étnicas.
Outro exemplo ótimo? Há alguns anos a Forbes publicou a lista das 75 pessoas mais ricas da história da humanidade, em dólar atualizado, de Cleópatra e dos faraós a Bill Gates. O estudo passou por cada ano da história humana para descobrir que 14 deles, quase 20%, nasceram num período de nove anos, entre 1831 e 1839, numa só região. Foram os pioneiros que, entre 1865 e 1879, estavam preparados para o período de maior transformação da história dos Estados Unidos, no boom da indústria petroleira, das ferrovias, dos primeiros bancos e do mercado de ações.
Como na geração do microcomputador, quem nascesse antes já estaria acomodado em outra atividade. Quem viesse depois, jovem demais, não teria experiência necessária. Ou não estaria preparado.
No que diz respeito às influências étnicas e culturais, dois grandes exemplos. Advogados judeus nascidos nos anos 40, filhos de pais pobres que passaram pela Grande Depressão, estavam preparados para a guerra das fusões empresariais que enriqueceu seus escritórios nos anos 80, produto de uma ética do trabalho que fez a diferença num mercado em que os americanos da elite branca se negavam a entrar em litígios. Assim como a complexa e absorvente cultura do arroz, somada à facilidade dos chineses para o aprendizado da matemática, ajudou a moldar sua obsessão pelo trabalho meticuloso que explica muito do domínio do país na exportação de produtos manufaturados.
Os meninos da geração do microcomputador carregam histórias de madrugadas dedicadas à programação, mas contaram a seu favor o ambiente familiar em que estavam inseridos, a disponibilidade de empresas e universidades interessadas no assunto na região em que moravam, as demandas por automação em crescimento acelerado, no lugar certo e na hora adequada.
Assim como, num cruzamento de estudos sobre QI e influência da genialidade sobre o desempenho e suas circunstâncias, Gladwell mostra como as pessoas nascidas antes de 1911 nos Estados Unidos foram prejudicadas pela Depressão, quando estavam jovens, e pela Segunda Guerra, quando maduros. Seus filhos, porém, tiveram as melhores oportunidades, num mundo em reconstrução, de melhores escolas, maiores demandas e mais empregos.
O livro defende a tese de que o esforço é, claro, imprescindível, e chega a metrificar o número de horas necessárias para que alguém atinja a excelência que a faz preparada para a oportunidade. Nada menos que 10 mil horas, três horas diárias por 10 anos. Dizem que os Beatles fizeram sucesso de uma hora para a outra quando se lançaram no mercado americano em 1963. Sim, mas Gladwell vai atrás das milhares de horas obscuras que ralaram em festivais ignotos e outros nem tanto – como o de Hamburgo – nos anos anteriores.
O que remete à questão da responsabilidade dos educadores e dos sistemas educacionais. O autor se estende sobre o caso de uma escola pública numa área miserável do bairro nova-iorquino do Bronx. Na base do estudo full-time , produziu alunos com capacidade suficiente para disputar vagas de universidades de renome em pé de igualdade com os jovens da elite bem sucedida.
Como se conclui, afinal, as oportunidades dadas a esses meninos para que tenham suas 10 mil horas de treinamento vão deixa-los devidamente preparados para as oportunidades do mundo lhes baterem à porta.
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